quarta-feira, 27 de julho de 2011

Segunda semana do Clube da Cena Unplugged

A segunda semana do Clube da Cena Unplugged foi baseada nas canções de Caetano Veloso.

Abaixo, uma palhinha do que foi a noite.

TREM DAS CORES, de Cristina Fagundes - Música: Trem das Cores
Com Marino Rocha e Priscila Assum 
Direção: Breno Sanches



AQUARELADO BRASIL, de Ivan Fernandes 
Música: London London
Com Cláudio Amado e RitaFisher 
Direção: Luiz Otavio Talu


COMO IDENTIFICAR E EXTERMINAR UM VAMPIRO, de Diego Molina
Músic:a Não Enche
Com Zé Guilherme Guimarães e Flavia Espirito Santo
Direção: Paulo Mathias Junior


TANTO QUERER de Renata Mizrahi – Música: O Quereres
Com João Rodrigo Ostrower e Mariana Costa Pinto
Direção: Luis Carlos Nem


NÃO, EU DISSE NÃO, de Cesar Amorim – Música: Meu Bem, meu Mal
Com Renato Albuquerque e Ana Paula Novellino
Direção: Miguel Thiré


TIGRESA, de Regiana Antonini
Música: Tigresa
Com Alex Nader e Mabel Cezar
Direção: Wendell Bendelack


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E como já é de costume a cada final de apresentação do Clube da Cena Unplugged, o público vota nas cenas que mais gostou e elas vão para o youtube.

E as cenas escolhidas na segunda noite foram:

Tigresa, de Regiana Antonini

Clique aqui e veja a cena no youtube.

Segue o texto na íntegra.


TIGRESA

PENUMBRA. OUVE-SE A MÚSICA “TIGRESA” (CAETANO VELOSO). A LUZ, AOS POUCOS, REVELA DAGMAR (UMA TRANSEXUAL) DUBLANDO A MÚSICA, VESTIDA COM: MEIA ARRASTÃO, SAPATO DE SALTO BEM ALTO, VESTIDO CURTO DE ONÇA, LUVAS 7/8 E OBVIAMENTE UMA PERUCA LOURA ATÉ A CINTURA. BRINCOS ANÉIS, PULSEIRAS E COLARES. CANTA FAZENDO UMA COREOGRAFIA NUMA CADEIRA A “LÁ CABARÉ”. UM TEMPO ASSIM. DE REPENTE OUVE-SE A VOZ DE JULIETE (AMIGA MULHER) QUE ENTRA EM CENA.

JULIETE – Dagmarrrrrr!!!!

A MÚSICA PÁRA E A LUZ SE ACENDE COMPLETAMENTE, REVELANDO QUE DAGMAR ESTÁ NO MEIO DA SALA DE UM APARTAMENTO, TIPO KITNET.

JULIETE – Dagmar! Dag...

DAGMAR – Ai, Juliete! Você desafinou: gritou em lá menor!

JULIETE – Tu tá de sacanagem, né Dagmar? Incorporou a cover da Madonna?

DAGMAR – Pára tá! Saco! Tô aqui ensaiando! Não suporto isso: essas suas entradas de emboscada! Já falei pra você não entrar aqui berrando! Você destrói minha cena!

JULIETE – Que cena, Dagmar?

DAGMAR – Como assim “que cena” Dagmar? A do meu show: “Tigresa de unhas negras”! Eu serei Kelly Stefânia, uma mulher sensualéeerrima, que provoca os homens, seduz, faz com que eles se apaixonem por ela e depois joga todos eles fora! Despreza e destrói o coração deles! Faz com eles o que ela quer, transformando-os em capachos, em ratos, em... pó! Ai, como eu amo essa personagem!

JULIETE – De novo isso, Dagmar? Tu fica aí sonhando... pirando na abobrinha... Ai credo viu! Se um dia tu me ver louca assim, tu me interna, não me deixa solta não, hein!

DAGMAR – Ai, Juliete como você tem uma alma pequena! Você não consegue alcançar a minha arte.

JULIETE – Não consigo mesmo! Até porque nem sei se ela existe!

DAGMAR – Aahhhh... Agora você está me ofendendo, me desrespeitando e isso eu não posso e não vou admitir!

JULIETE – Tá bem! E tu pode me dizer quando e como esse teu show vai sair do plano do sonho e se transformar em realidade?

DAGMAR – Estamos estudando algumas propostas...

JULIETE – Estamos quem cara pálida?

DAGMAR – Eu e minha equipe. Sim porque eu tenho uma equipe! Várias pessoas que trabalham em prol do meu show!

JULIETE – E eu tenho dois ouvidos pra ficar escutando essas suas sandices. Dagmar, tu tá pior do que eu pensava!

DAGMAR – Querida, presta atenção: eu sou uma estrela! Uma estrela em ascensão! Todos querem estar perto de mim! Não te contei? O Sérgio Murilo, que é uma pessoa maravilhosa, me convidou pra fazer essa personagem bombástica, numa festa na casa dele. Vou sair de dentro de um bolo de oito andares! Acontece que a festa foi adiada! E o Sérgio Murilo, que é simplesmente genial resolveu transformar a festa numa performance. E o primeiro lugar onde vamos nos apresentar será no aeroporto. Na pista! Depois, será a vez do cemitério. A primeira pessoa vip que fizer a passagem será presenteada com a minha voz! Eu vou cantar pra ela subir! (RI)

JULIETE – Chega, Dagmar! É muita porra louquice junto! Tenho que ficar te colocando na real todos os dias! Dagmar tu é apenas uma camareira! Pronto, falei! Se liga, fofs!

DAGMAR – A inveja não mata apenas, ela, antes de matar provoca uma enorme confusão na cabeça das pessoas. Presta atenção: eu não sou camareira Eu estou camareira! Passando por uma fase back stage! E depois, todas - eu disse “todas” - as divas do nosso teatro, do nosso cinema me querem, me desejam ao lado delas! E tudo isso por quê? Ora queridinha, eu sou profissional! Entro de corpo e alma em tudo o que faço! Sou intensa! Sou profunda! Sou feliz! E tenho dentro de mim, essa alma de artista! Ai, como é bom poder tocar um instrumento!

JULIETE – É bom também arrumar a casa de vez em quando, sabia?

DAGMAR – Agora não posso. Tenho que me preparar pra minha filmagem! AH!!! Eu te contei? Vou fazer o filme! Lembra aquele teste que eu fiz pro filme do Tom Cruise?

JULIETE – Aquele em que EU trabalho?

DAGMAR – Sim, querida, servindo café e bolinho, né? Sim porque alguém tem que fazer isso pra gente! Então, passei! Ai, como eu sou dinâmica! Jogo nas 11, fofa! (VAI SE EMPOLGANDO E FALA VOZ SENSUAL, MEIO ROUCA, COMO SE ESTIVESSE DANDO UMA ENTREVISTA) Sim eu estou muito feliz, muito emocionada... Pra mim é um prazer enorme estar participando desse projeto... Eu fui convidada pelo David, que é uma delícia de pessoa, pra fazer essa personagem deslumbrante. E o David, ele é simplesmente genial! Ele chega no set e sabe exatamente o que vai fazer, sabe o que quer da cena, dos atores, então, o nosso trabalho, nesse sentido foi muito fácil. Eu gravava cerca de cinco, seis cenas por dia. Não, não tive pudor nenhum, confiei na direção do David. Esse filme é um filme de amor, de sedução e a minha personagem, que é uma dançarina de cabaret, sim ela trabalha no “frenetic Dancing Days”! Então precisava mesmo ser bem sex appeal, bem felina mesmo! Eu quis fazer todas as cenas, não usei dublê! Dancei em todas! O nu é completamente artístico! As cenas de sexo foram feitas focadas no sentimento da personagem e não no sexo propriamente dito! Então, ficou lindo! Sem falar que contracenar com o Tom foi divino! Ele é um cara que sabe tudo realmente, além de ser um homem muito sensual! Espero que vocês aí no Brasil curtam assistir o filme tanto quanto eu curti fazê-lo!

JULIETE – Chega, Dagmar! Pirou? Volta pra terra!

DAGMAR – Hã? Acho que me empolguei e comecei a dar uma entrevista para o Tele-Cine Pipoca! De repente, eu já estava ensaiando as minhas respostas! É que sou geminiana, com ascendente em aquário e a lua em leão, ou seja sou muito rápida!

JULIETE – E da onde você tirou que vai dar uma entrevista para o Tele-cine Pipoca?

DAGMAR – Como da onde? O David é um diretor americano, que se encantou comigo, com o meu potencial, com o meu talento! Quer me lançar, hunny! Porque então, eu não daria entrevista para o Tele Cine Pipoca ou para o Sony Enterteiment Television?

JULIETE – Porque pelo que eu saiba, tu só faz uma ponta nesse filme.

DAGMAR – Querida, eu nunca faço ponta! Quem faz ponta é lápis! Presta atenção: eu faço uma participação no filme do Tom. Uma participação muito especial!

JULIETE – Ah, é! Uma participação especial de uma cena só, onde você entrega uma carta para a criada e diz “this letter is for Mrs Jones”!

DAGMAR – A nível de dúvida, querida: você leu o roteiro? Porque se você realmente leu o script, você deve saber que esta carta é fundamental para a história. Mrs Jones está há semanas esperando por ela. Então, eu não entrego uma carta não, eu entrego “a” carta! A chave de todos os segredos! A revelação de um grande mistério!

JULIETE – E daí?

MICHEL – Como e daí? Tá louca bicha? Não pode ser qualquer atriz nesse papel não! Tem que ter peso dramático, porra! Eu fiz teste...

JULIETE – Pra testar o seu inglês e não a sua interpretação!

DAGMAR – Juliete, olha só: eu já nasci predestinada! Tenho até um nome artístico de estrela! Rebeca Fonda!

JULIETE – Teu nome é Dagmar da Silva! Não se esqueça que você tem o da Silva!

DAGMAR – Cala a boca! Eu já cortei o da Silva há muito tempo! E ser Dagmar é só um detalhe! Detalhe bobo! Meu nome artístico é Rebeca Fonda! Querida, sou operada! Se troquei de sexo, trocar de nome é pinto! (VIRA E FALA TIPO DUBLANDO COMO AS VINHETAS DO TELECINE E DO CANAL SONY) “Oi, eu sou Rebeca Fonda e eu assisto o Tele Cine Action!” Ou então: “Hello, I’m Rebeca Fonda! You are watching the Sony Entertement Television!”...

JULIETE – Dagmar, o pior é que tu acredita mesmo que isso vai dar certo...

DAGMAR – Óbvio! Amanhã, quando eu for gravar a cena da carta, eu vou fazer aquele meu olhar lânguido, meia taça, tipo “Angelina Jolie”, manja? Aí, vou olhar pro Tom e dizer: (VOZ ROUCA SENSUAL) “Hellô,Tom, nice to meet you! I’m Rebeca Fonda, a brasiliam actriz!” (VOLTA A VOZ NORMAL) E aí, quando o diretor disser “Action”! Eu faço meu olhar fatal e digo o meu texto: (VOZ ROUCA) “this letter is for Mrs Jones! Please tell her that I am here”!

JULIETE – Que texto é esse?

MICHEL – Eu criei! Pra dar mais coerência à minha personagem, a Pâmela...

JULIETE – Que Pâmela? Sua personagem não tem nome! Não existe nenhuma Pâmela! No roteiro está escrito: entra uma “pessoa” e entrega a carta para a criada de Mrs. Jones.

DAGMAR – (SEM OUVIR JULIETE) Eu até pensei em colocar mais uma frase: (VOZ ROUCA) - “this letter is for, Mrs Jones! Please tell her that i am here”! She is waiting for me!”

JULIETE – Vem cá, você vai filmar num set ou num aeroporto? Sim porque tu tá falando que nem a Iris Letieri anunciando o embarque do próximo vôo!

DAGMAR – A inveja mata mesmo!

JULIETE – E a ilusão pira o cabeção!

DAGMAR – Que ilusão! Eu tenho certeza que o Tom Cruise vai me olhar e imediatamente perceber que eu sou uma atriz assim... promissora e claro, vai querer me comer!

JULIETE – Caraca! Agora tu pirou de vez! Tu acha mesmo que o Tom Cruise vai querer te comer?
DAGMAR – Acho não, tenho certeza! Vou te contar um segredo: ele já me quer!

JULIETE – Hein, Dagmar?

DAGMAR – Ele me olha com olhos famintos!

JULIETE – Deve estar te confundindo com uma avestruz!

DAGMAR – Pára, tá minha filha! Você não sabe de nada! Eu fui lá no set hoje ver as filmagens! Quando ele me viu, cochichou alguma coisa no ouvido do produtor que veio imediatamente me perguntar quem eu era!

JULIETE – Claro, uma pessoa louca que invade o set e fica lá, comendo O Tom Cruise com os olhos causa um tipo de estranhamento, curiosidade! Então, ele mandou perguntar quem era você, porque não te conhecia! Achou que fosse uma figurante cara de pau, que é o que você realmente é: figuração com fala, pronto, falei!

DAGMAR – Vem cá, é impressão minha, ou você está querendo bater boca comigo?

JULIETE – Não quero bater boca com ninguém! Eu quero é que tu caia na real!

DAGMAR – Quem tem que cair na real aqui é você! Presta atenção: sua amiga aqui é uma estrela! Pronto, falei! Agora, lida com isso!

JULIETE – Dagmar, tu precisa voltar a fazer terapia! E rápido!

DAGMAR – Não posso! Os pacientes daquela clínica me descobriram! Fica todo mundo querendo autógrafos, fotos comigo! É um inferno! Fico exausta, sufocada! Me sinto invadida!

JULIETE – Imagino...

DAGMAR - Mas, fazer o quê? Essa é a minha profissão! O assédio faz parte! Então, faço assim: se não tô num dia bom pra dar autógrafos e ser simpática com o meu público, nem saio de casa!

JULIETE – Você tem razão! Melhor ficar em casa mesmo...

DAGMAR – Mas o pior são os paparazi! Me seguem o tempo todo! (APONTA) Olha pela janela... Viu? Deve ter uns trinta lá embaixo! Daqui a pouco, piram mais e alugam aquele apartamento ali da frente, só pra poderem me pegar tomando banho e tirar uma foto espontânea! (COLOCA BONÉ E ÓCULOS ESCUROS) Agora, só posso sair assim: disfarçado! Eu tava até falando com o Gi...

JULIETE – Gi? Quem é Gi?

DAGMAR – Giani...

JULIETE – Giani...?

DAGMAR – Chinni!

JULIETE – Ah, tá! Agora, que o Tom Cruise vai te comer, claro, você virou a melhor amiga do Gianechinni! Vem cá, ele também não quis ter um casinho com você?

DAGMAR – Pára tá! Não tenho nada com O Gi. Tô cansada de ter que ficar desmentindo coisa! Somos só bons amigos! O que a gente tem é uma boa química! Isso confunde a cabeça das pessoas, é natural, mas é só cena mesmo!

JULIETE – (DEBOCHADA) Ah, é, eu me esqueci que tu fez uma novela com o Gianechinni...

DAGMAR – Não fiz, não! Não fiz, mas vou fazer! E será um filme! E como eu sei que as cenas serão bem quentes, eu já tenho as respostas na ponta da língua!

JULIETE – Eu fico impressionada com a certeza que tu tem das coisas! É incrível isso! Tu é abusada mesmo!

DAGMAR – Sou, querida! Mas eu posso ser! E digo mais: com esse filme, eu serei a primeira atriz brasileira a ganhar o Oscar! Sim porque a Fernanda foi só indicada! Não vale!

JULIETE – Pronto, era o que faltava para o Brasil se projetar: além de ter tido um presidente que nasceu pobre e conseguiu vencer agora, uma atriz brasileira, operada, completamente desconhecida, faz um filme com o Gianechinni, que também é brasileiro, e ganha o Oscar, coisa que o mundo do cinema americano sonha! É fantástico! Eu tô achando que tu não é abusada só não, tu é maluca mesmo, louca de pedra!

DAGMAR – Não, meu bem, eu vi o “The Secret”! Você não deve ter visto, por isso está boquiaberta com o meu destino! O segredo é você dar ordens para o universo! Você manda e ele obedece! Se eu estou dizendo - e quando eu digo, eu logo acredito - que serei uma estrela universal, é porque isso vai acontecer! Então, eu estou me preparando para esse momento da minha vida que já está praticamente batendo na minha porta! Toc, toc, toc! Quem é? É a fama! O sucesso!

JULIETE – Isso significa, que se eu quiser, me ver livre de você, é só eu ordenar ao universo, que você some rapidinho?

DAGMAR – Juliete, amada: você jamais vai querer sair de perto de mim! Sabe o que vai acontecer com você? Será minha assessora! Vai ter emprego garantido pro resto da vida! E vai ganhar em euros! Sim, porque eu vou morar numa mansão na Grécia!

JULIETE – Ok! Pra mim já deu. Eu não vou falar mais nada! Até porque, eu estou atrasadíssima! Vou lá servir os meus bolinhos e os meus cafés! Adeus, tigresa! (SAI)

DAGMAR – Coitada da Juliete... Tá completamente derrotada pela vida! (P/ PLATÉIA, NO CLIMA DA ENTREVISTA) Eu ainda estou estudando alguns roteiros... Também fui convidada pelo Silvinho... Silvio... De Abreu! Então, o Sil me convidou pra fazer uma personagem maravilhosa na sua novela... É, eu ia ser a vilã da trama! Mas aí, a Mariana Ximenes foi lá, pediu pra ele, e como o Silvinho é um gentleman, acabou dando o papel pra ela. Aí ficou cheio de dedos pra falar comigo. Eu disse: Sil, fofo, relaxa! A Mari vai fazer bem! Vai fazer par com o Tony! Adoro o Tony! A gente tem uma boa química em cena! Em cena, hein! Escreve direito, se não a mulher dele me mata! Ah, rola um ciume, sim! Rola, pronto, falei! O quê? Namorando? Olha só, eu realmente não quero falar sobre esse assunto! Vamos falar sobre o meu show?  “Tigresa de unhas negras!” Também adoro o nome. Tem tudo a ver comigo! Claro, vou dar uma palinha, tá! Em primeiríssima mão!
VOLTA A CANTAR E DANÇAR A MUSICA TIGRESA, COMO NO INÍCIO DA CENA.

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A outra cena é Não, eu disse não, de César Amorim

Clique aqui para ver a cena no youtube.

E segue o texto na íntegra.

NÃO, EU DISSE NÃO.
De César Amorim.
DO FUNDO DO PALCO, WANDERLÉA, COM UM ANEL DE LUA E ESTRELA NO DEDO, ENTRA DE PRETO, SEGURANDO UM BUQUÊ DE FLORES, E PARA NO PROCÊNIO. ELA ESTÁ MUITO TRISTE.
WANDERLÉA – Escolha e perda. Uma não vive sem a outra. Perder pra mim é como ser amputada.  Quando terminei meu noivado com o Erasmo, semana passada, em pleno altar, por causa do Roberto, saí por cima. Mas bastou descer os degraus da igreja pra me sentir amputada.  Eu tenho um sonho recorrente: eu, toda de preto, numa penitenciária de segurança máxima, numa cela minúscula, com um número 30 na porta e sendo chamada de balzaquiana pelas outras detentas. Acho que isso é um presságio. Não casar, pra mim, é o isolamento social. Todas as minhas amigas se casaram antes dos 30. E eu tenho que seguir o padrão. Sou muito focada, corro atrás dos meus objetivos. Foi assim quando perdi a virgindade. Escolhi a vítima, mirei e fui com tudo. Foi uma merda. Não perdi a virgindade com ele. Eu tinha o hímen complacente. Perdi pro médico que me operou. E, claro, quase me apaixonei perdidamente por ele. Um bisturi na minha vagina e eu fantasiando com o homem, gente. Com o homem que me amputou. Bom, eu achava que isso não importava mais. Que o que importava era que ali estava eu no enterro da Sarah Jéssica.  Por causa da morte da minha melhor amiga, eu podia estar deixando de conhecer o homem da minha vida. O nick, as fotos, o papo, tudo me levava a crer que ele podia ser O cara.  Eu enterrava a minha cadelinha e pensava nisso. Fazer o quê? Escolhas. Perdas. Amputações.
ELA, MUITO EMOCIONADA, COLOCA, DELICADAMENTE, O BUQUÊ NO CHÃO E FAZ UMA ORAÇÃO SILENCIOSA. DO FUNDO DO PALCO, ENTRA CAETANO, CERCA DE 40 ANOS, TAMBÉM DE PRETO, ÓCULOS ESCUROS, COM UMA ROSA NAS MÃOS E PARA AO LADO DELA. ELA NÃO O PERCEBE DE IMEDIATO. ELE DEPOSITA A ROSA AO LADO DO BUQUÊ, NO CHÃO.
CAETANO – Vai fazer muita falta.
WANDERLÉA – Oi?
CAETANO – Sarah Jéssica. Era uma boa companheira.
WANDERLÉA – Você conhecia a Sarah Jéssica?
CAETANO – Claro. Uma alma boníssima. E de uma fidelidade, desculpe o trocadilho, canina.
WANDERLÉA – Obrigada, mas quem é você?
CAETANO – Um velho amigo da família.
WANDERLÉA – Eu sou a família da Sarah Jéssica e ela nunca me falou de você.
CAETANO – É... normal. Compreensível. Ela tinha certa dificuldade em pronunciar o meu nome.
WANDERLÉA – Olha, legal, você é super espirituoso, mas eu não tou com clima pra brincadeira. Fala logo quem você é.
CAETANO – Prazer, “Mulhersolteiraproocura29”, eu sou o “Ultimoromanticorj”.
WANDERLÉA – Meu Deus, você é o... Não, não pode ser.
CAETANO – Por quê? Tou tão diferente assim?
WANDERLÉA – Não, não é isso. Quer dizer, é isso também. Você não tem nada a ver com a foto. E eu não te disse que ia enterrar minha cachorra. Como você...?
CAETANO – É, a foto não me valorizou o suficiente.
WANDERLÉA – Pelo contrário, ela te valorizou demais. Querido, aquela foto não é sua.
CAETANO – Claro que é. Eu tirei ela. Sou fotógrafo. É minha.
WANDERLÉA – Isso é alguma piada? Você colocou uma foto... não, uma só não, você colocou várias fotos de um cara que não tem nada a ver com você.  E... espera... eu acho que te conheço. Tira os óculos.
ELE, LENTAMENTE, TIRA OS ÓCULOS.
WANDERLÉA – Eu te conheço sim! De onde, meu Deus?
CAETANO – Eu fui o primeiro homem da tua vida.
WANDERLÉA – Como é?
CAETANO – Você não pode ter esquecido. Não se esquece uma coisa dessas.
WANDERLÉA – O que você tá dizendo é impossível. O meu primeiro homem foi o meu primeiro namorado.
CAETANO – Não. Não foi teu namorado. O teu primeiro homem fui eu. Eu sei, e você sabe que eu sei. Esse cara pode ter sido o teu primeiro amor, mas o homem que te fez mulher fui eu.
WANDERLÉA FICA CHOCADÍSSIMA.
WANDERLÉA – Meu Deus!
CAETANO – Eu marquei demais, tou sabendo.
WANDERLÉA – Você foi o meu... o meu ginecologista! Doutor...
CAETANO – Caetano. Eu fui ou não fui teu primeiro homem?
WANDERLÉA – Claro que não.
CAETANO – Não foi isso que você me disse no consultório, na hora em que eu estava tirando tua virgindade.
WANDERLÉA – Eu era uma garota. Romântica. Você era bonito, carinhoso, atencioso. E eu de pernas abertas, carente, vulnerável. Gente, qualquer menina fantasiaria.
CAETANO – E qualquer homem se excitaria.
WANDERLÉA – Não, só os doentes como você.
CAETANO – Não fala assim. Você foi a primeira mulher que tirei a virgindade. E a última. Nunca mais peguei um caso de hímen complacente. E todas as namoradas que tive já haviam dado pra outros. Umas piranhas, vagabas, vampiras, mesquinhas. Você não. Você é o meu vício, desde o início.
WANDERLÉA – Que vício, gente? Início do quê?
CAETANO – O início da nossa relação. Do nosso caso de amor.
WANDERLÉA – Que amor, garoto? Que amor? O nome disso é obsessão.
CAETANO – O nome disso é amor verdadeiro. E não aquilo que aquele idiota do Erasmo sentia por você.
WANDERLÉA – Você sabe do Erasmo?
CAETANO – E do Roberto. Eu tava na igreja... fotografando. O Erasmo me contratou. Eu não esperava aquele show. Roberto dizer que tava amando loucamente a namoradinha do melhor amigo foi demais. E as fotos da cara do Erasmo ouvindo isso ficaram impagáveis.
WANDERLÉA – Você tava me seguindo? Mas, no dia do meu casamento, a gente não tinha teclado ainda.
CAETANO – Claro que já.  Eu não sou o único amigo virtual que você tem. Prazer, eu também sou a “Jéssicacarente” e a “Mulherprecisadehomemjá”.
WANDERLÉA – Não! Não é possível. Elas são as minhas melhores amigas virtuais! Eu vi as fotos delas.
CAETANO – Lindas, não? São minhas modelos. Assim como o rapaz que emprestou o corpo pra ser eu. Fotografar é um dos meus hobbies.
WANDERLÉA – Mas como? Não me diz isso! Elas não podem ser de mentira. Elas fazem parte da minha vida. Eu amo elas.
CAETANO – Eu sabia que ia ouvir isso de você. Eu também te amo.
WANDERLÉA – Desde quando você me persegue?
CAETANO – Desde quando você ganhou esse anel.
WANDERLÉA – O que é que tem esse anel?
CAETANO – Era da minha mãe. Estava no penhor e foi a leilão. O Erasmo arrematou e te deu de presente. Eu tentei dar o maior lance, mas ele venceu. Aquele filho da puta tirou a última lembrança da minha mãezinha.  Eu tinha prometido a ela, no leito de morte, que iria trazer o anel de volta pra nossa família. E foi o que tentei fazer. Passei a seguir o Erasmo e vi o dia em que ele te deu e te pediu em casamento.  Eu não acreditei. Te reconheci de imediato. A mulher que eu desvirginei estava usando o anel da minha mãe. Era um sinal. Minha mãezinha me levou até você, meu amor.
WANDERLÉA – Olha, é realmente linda a sua psicopatia, tocante, mas eu não posso cuidar de você. Sou atriz e o máximo que me aproximei de gente maluca foi fazendo teatro empresa nas plataformas da Petrobrás. Saia daqui, por favor. Eu não quero nada com você. 
CAETANO – Mas eu sou ideal pra você. Eu correspondo perfeitamente às três principais qualidades que você procura num homem. Primeiro, sou heterossexual, convicto.  Segundo, tenho bons dentes. Meses no dentista pra ficar do jeito que você gosta. E terceiro e o motivo maior da minha demora em me revelar.
ELE TIRA UMA PÁGINA DO DIÁRIO OFICIAL DO BOLSO.
CAETANO – Sou empregado público. Depois de anos estudando passei em primeiro lugar no concurso pra médico do estado.  Saiu hoje o resultado. Tá aqui, ó, o Diário Oficial. Tá vendo? Melhor partido do que eu não há. Então, vamos?
WANDERLÉA – Pra onde?
CAETANO – Pra nossa casa. Vai, fala que sim.
WANDERLÉA – Você é uma criatura, no mínimo, apavorante. Vem com esse olhar de maníaco sexual, no enterro da minha cadela, querendo que eu diga sim? Pois bem, leia nos meus lábios, Norman Bates. A minha resposta é NÃO! Eu disse NÃO!
CAETANO – E eu digo sim. Eu digo não ao não. 
WANDERLÉA – Esse papo seu tá qualquer coisa. Você tá pra lá de Marrakesh, seu doente.
CAETANO – Doente? Quem é mais doente aqui? Eu, que amo você à distância há anos e que sei tudo da sua vida, que te conheço bem, ou você, que quer casar com um homem qualquer em poucas semanas só pra não chegar aos 30 anos solteira? Me diz, quem é mais doente?
WANDERLÉA – Tá, tudo bem, estamos competindo pelo ouro, mas não vou me casar com um homem qualquer, vou casar com o homem certo. E ele, definitivamente, não é você.
CAETANO – Acho que a sua certeza acaba hoje. Aqui. Se o seu homem certo não sou eu, não será mais ninguém. Nós dois, juntos, vamos fazer companhia a Sarah Jéssica.
ELE RETIRA UM PUNHAL DO BOLSO, ENROLADO NUM LENÇO, E MOSTRA PRA ELA.
WANDERLÉA – Esse punhal é meu. Foi do meu pai. Onde você conseguiu?
CAETANO – Numa das muitas vezes em que fui te ver dormindo no teu quarto. Ainda tem tuas digitais. Foi uma troca justa. O anel da minha mãe pelo punhal do teu pai.
 ELE PARTE PRA CIMA DELA, SEMPRE SEGURANDO O PUNHAL COM O LENÇO. ELES LUTAM, ELA PEGA O PUNHAL E ELE SE JOGA SOBRE ELE, SENDO ATINGIDO.
WANDERLÉA – Ai, meu Deus! Olha que você fez! Socorro! Alguém ajuda aqui!
CAETANO – Você me matou!
WANDERLÉA – Não, você quis me matar, eu só...
CAETANO – Não é o que meus amigos vão pensar. Eles sabiam da nossa relação. E sempre souberam da sua obsessão por mim.   Eu era ameaçado por você durante anos e hoje iria vê-la pra resolver essa história.
WANDERLÉA – Isso é mentira!
CAETANO – Fala isso pra polícia. Homicídio doloso. Premeditado. Trinta anos de prisão.
WANDERLÉA – 30 anos! O meu sonho, meu Deus!
CAETANO - Eu te amei tanto, meu bem... meu mal...
ELE MORRE E ELA GRITA. 
CONTINUA...                                    

FIM.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

O Clube da Cena está de volta!!!

O Clube da Cena voltou. E agora na versão Clube da Cena Unplugged.

A cada sexta-feira, o Teatro Maria Clara Machado abre suas cortinas para um novo espetáculo, inspirado nas músicas de grandes compositores da música popular brasileira. 

O Clube da Cena, coletivo de atores, autores e diretores se reúne novamente para criar um novo espetáculo a cada semana, desta vez, a partir das letras de alguns dos principais compositores da música brasileira, é o Clube da Cena  Unplugged. 

A cada sete dias será produzida uma nova peça, homenageando toda noite um grande nome da música popular brasileira. O Clube da Cena Unplugged começa dia 15 de julho, às 21h no Teatro Municipal Maria Clara Machado, onde fica em cartaz até 02 de setembro, sempre às sextas-feiras.

Compositores Homenageados:

Dia 15 de julho – Roberto Carlos
Dia 22 de julho – Caetano Veloso
Dia 29 de julho – Raul Seixas
Dia 05 de agosto – Rita Lee
Dia 12 de agosto – Cazuza
Dia 19 de agosto – Noel Rosa
Dia 26 de agosto – Chico Buarque
Dia 02 de setembro – Tim Maia

O projeto reunirá oito autores, dez diretores, 26 atores, um músico e convidados especiais para escrever, dirigir e encenar uma peça inteiramente nova a cada semana, inspiradas em músicas. Tudo funcionará através de sorteio. Seis músicas emblemáticas de um grande compositor serão selecionadas e distribuídas, a cada semana, por meio de sorteio, a seis autores. Cada dramaturgo terá apenas uma semana para criar uma cena a partir da música recebida. Depois disso, um novo sorteio definirá dois atores e um diretor para encenar os seis textos escritos, também em apenas uma semana.  Passados sete dias, as equipes se reúnem para um ensaio técnico de som e de luz e o espetáculo começa.   O público vota nas 2 melhores cenas da noite e elas são postadas no youtube e no blog do projeto clubedacena.blogspot.com na mesma semana.

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Abaixo uma palhinha da noite de estreia.

FELIZ ANIVERSÁRIO – de Renata Mizrahi – música Quero que Tudo Mais Vá para o Inferno. Com Cacau Berredo e Mariana Santos. Direção Cico Caseira



SHEILA CURTIU ISSO – de Diego Molina – música Minha Fama de Mau. Com Maíra Kesten e Marcelo Dias. Direção Márcio Libar


SIM – de César Amorim – música Namoradinha de Um Amigo Meu. Com Jorge Neves e Pia Manfroni. Direção Lincoln Vargas


DETALHES – de Leandro Muniz – música Detalhes. Com Luis Lobianco e Bia Guedes. Direção Wendell Bendelack


O PLANETA DOS BONS PRINCÍPIOS – de Ivan Fernandes – música Ilegal, Imoral ou Engorda. Com Zé Auro Travassos e Alexandre Barros. Direção Alexandre Bordallo


O AMOR QUANDO ACONTECE É ASSIM – de Cristina Fagundes. música Cama e Mesa. Com Thaís Lopes e Cristina Fagundes. Direção Susanna Kruger


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E como é comum nas noites do Clube da Cena, a plateia vota nas melhores cenas da noite. E as cenas vão para o youtube.

E as escolhidas da noite de estreia estão abaixo:

Acesse a cena no youtube, clicando aqui . E leia abaixo o texto na íntegra.

O AMOR QUANDO ACONTECE É ASSIM
De Cristina Fagundes
Música destas de festa de casamento tipo: this is my last chance to... Mulher toma um drink numa festa.  Está tímida, num canto, olha em volta, desconfiada.  Outra mulher a avista e caminha até ela. Nota da autora: A cena toda deve ser feita de forma muito verdadeira, sincera e desarmada para funcionar pois o texto já é muito cara de pau.
AMANDA – Cíntia, então você ta aí! Já tava achando que você não vinha!
CÍNTIA – Imagina, é que eu tava.../ (a outra corta)
AMANDA – Cabelo novo! Deixa eu ver... (gira a outra) Você não foi na Igreja por que?
CÍNTIA – Não deu pra eu...
AMANDA – Você já viu a Dani de noiva?
CÍNTIA –  Não, é que eu cheguei agora e.../ a outra corta
AMANDA - Ela tá tão feliz! Toda noiva é feliz mas a Dani tá numa alegria que.  (puxa a outra como uma Irmã mais velha que aconselha a mais nova, fala baixo) Amiga, você não pode mais ficar faltando aos casamentos só porque não se casou.  Fica feio.
CÍNTIA: (tenta se explicar) Mas eu não.../
AMANDA: No casamento da Laurinha foi a mesma coisa. As pessoas já tão comentando... hum? (frívola) Escuta, o Otávio trouxe um amigo, um amigo pra te apresentar.  
CÍNTIA – Outro? Quem é?
AMANDA – O Amaral.
CÍNTIA – Mas eu já conheço o Amaral.
AMANDA – E daí?
CÍNTIA – O Amaral é careca.
AMANDA – E?...
CÍNTIA – Tem a sobrancelha cabeluda.  
AMANDA – E?
CÍNTIA – É que eu acho que isso não combina, entende? Não combina. E ele palita, (com nojo) ele palita os dentes na mesa.
AMANDA – (definitiva) E você já fez 39 anos.
CÍNTIA – (suspira – essa calou fundo).
SILÊNCIO entre as duas.
CÍNTIA – Acorda amiga, o tempo passou, agora só tem Amaral (NO SENTIDO DE SÓ TEM HOMEM RUIM POR AÍ) por aí, fazer o quê? Se você tivesse se casado com o Afonsinho como eu te falei...
AMANDA – Mas eu não gostava do Afonsinho.
CÍNTIA – E você acha que eu gostava do Otávio quando eu me casei? Eu hein, Cíntia, você tem umas idéias que. Ou você acha que eu ia ficar esperando um príncipe encantado que me desse um beijo de novela a cada cinco minutos? Só se fosse pra acabar ficando sozinha nas festas que nem você, olha aí no que deu...
(Chega um homem LINDO dá um beijo de novela em Cíntia. Amanda olha surpresa).
CÍNTIA: Amanda esse é o Vinicius. 
VINICIUS: (sempre charmoso, é um cara interessante e viril ao mesmo tempo – sabe que tem poder sobre as mulheres mas não é canastra, tem que ser natural, sincero ao extremo senão não tem graça – isso é que vai desconcertar) BEIJANDO A MÃO DE AMANDA: Prazer Amanda. (olha pra Cíntia) Cortou o cabelo? Deixa eu ver... você tá linda!  (novo beijo em Cíntia, percebemos que há fogo entre eles, algo caliente) Desculpa, desculpa o atraso vai, de verdade, mas é que a reunião não acabava nunca, ah!!  Fechamos com os árabes!!Fechamos com os árabes! A concessão agora é nossa até 2020! 
CÍNTIA: Ai que bom meu amor! Não acredito! (novo beijo) (Cíntia, sempre tímida, situa a amiga) O Vinicius trabalha com petróleo!
VINI: Vem cá, vamos comemorar!! (dá novo beijo nela)   
CÍNTIA: (sem graça) Amor...  
VINI: (PRA AMANDA COMENTA SOBRE CÍNTIA) Ela fica linda sem graça. (pra CÍNTIA) Mas espera, espera que tem mais. (tira uma folha de papel e coloca na mão dela).
CÍNTIA: Que isso?
VINI: As reservas pra Cuba, a gente parte amanhã.
CÍNTIA – Não acredito! (beija ele) (explica pra Amanda) O Vini também é músico e ele conhece o pessoal do Buena Vista. A gente vai acompanhar a gravação do novo cd do Buena Vista lá em Cuba, não é incrível? 
AMANDA (PASMA) Buena Vista...o filme?
CÍNTIA – É. Você viu?
AMANDA – Não, eu até queria, mas você sabe, o Otávio não gosta de cinema.
CÍNTIA – (explica pra rafa) O Otávio é o marido dela. Ele detesta cinema, ele nunca foi com ela no cinema, você acredita?
VINI – Poxa, que pena, mas você pode ir com as suas amigas né?
AMANDA – ah, fica difícil, as minhas amigas são todas casadas, quer dizer, tirando a Cíntia né? Que ainda num...
VINI – Ah, mas isso vai ser por pouco tempo né amor? (outro beijo – alisa a barriga de Cintia com carinho) E se prepara que eu vou querer 5, 5 filhos hein? Pra gente encher aquela nossa casa tem que ser pelo menos 5! (ri)
CINTIA – (rindo também) é mesmo. 
VINI (vê que o drink dela acabou) Olha aí, acabou amor.  Eu pego outro pra você.  (pega a taça - novo beijo dele nela – Amanda constrangida de vela)
AMANDA- Por que você não me disse que tava namorando?
CÍNTIA – O Vinícius mora num lugar enorme, é um sitio.
AMANDA – Um sitio? Ué, mas então ele mora fora do Rio?
CÍNTIA – Não. Em Ipanema.    
AMANDA – Gente, mas eu nem sabia que tinha sítio em Ipanema...
CÍNTIA – (simples sempre, sem afetação) Pois é, nem eu. (amiga, compartilhando descoberta) Amiga, tem todo um mundo dessa gente muito rica que a gente não conhece, são coisas inacessíveis pra gente. Você acha que é uma rua sem saída mas é um sítio em Ipanema e por aí vai.  O Rio é outra cidade pra quem tem dinheiro, sabia?
SILÊNCIO DAS DUAS.
CÍNTIA – Mas eu não sei...
AMANDA – Não sabe o quê?
CÍNTIA – Não sei se ele é a pessoa certa pra mim.
AMANDA – Como assim?!
CÍNTIA – A gente se conhece há tão pouco tempo...
AMANDA – E?
CÍNTIA – E ele é tão incrível.
AMANDA – É, ele é incrível.
CÍNTIA – Que ás vezes parece mentira de tão bom.
AMANDA – (consigo) parece mesmo...
CÍNTIA – Mas eu investiguei amiga. Você não vai acreditar, eu botei um detetive atrás dele.
AMANDA – Um detetive?! E aí? Ele é gay?
CINTIA – Não.
AMANDA – É drogado?
CÍNTIA – Não. Mas...
AMANDA – Mas...?
CÍNTIA – Eu descobri que o Vini vem de uma família de intelectuais que ganharam na loteria.
AMANDA – (sobe o tom) Na loteria?!
CÍNTIA – Shhhh... Primeiro foi o pai dele, depois a mãe, a mãe dele também ganhou na loteria, você acredita? Daí que ele é culto mas tem dinheiro. O que eu acho ótimo, mas é que tem umas coisas nele que... ele é diferente dos outros sabe?
AMANDA – (ficando puta) como assim?
CÍNTIA – é que ele... ele faz umas coisas na cama que eu...
AMANDA – (feliz) Ele é gay!
CÍNTIA – Não, mas ele faz umas coisas que... não é normal entende? Ai meu deus.
AMANDA – (preocupada) o que que tá acontecendo Cíntia, me conta.  Olha, se ele é tão especial assim, não tem problema se o sexo não for tão perfeito, fazer o quê? Olha, o Otávio, eu nem devia te contar isso, mas você é minha amiga e eu vou te contar.  Entre amigas não deve haver segredos. Pois bem: o meu marido, depois que perdeu o emprego ele...
CÍNTIA – Ele perdeu o emprego?
AMANDA – Perdeu. Foi demitido.  Mas, se deus quiser ele.... Bem, o fato é que o Otavio não tem conseguindo mais entende?
CINTIA – O que?
AMANDA – Ele... ele... o Ótavio tá incapaz Cíntia. Incapaz.
CÍNTIA (tentando entender) Incapaz...?
AMANDA: È como seu eu dormisse com uma mulher, pior, como seu eu dormisse com uma irmã entende?
CÍNTIA – Então o Otávio não...
AMANDA – Mas escuta, o que eu quero dizer é que se esse homem te faz feliz... bem, se ele te, um homem não pode ter tudo entende?
CÍNTIA – Mas o problema não é esse, Amanda, é só que o Vini, o Vini faz umas coisas que.
AMANDA – Conta, pode me contar. O que ele que ele te faz?
CÍNTIA: Ele me faz ter orgasmos múltiplos. 
AMANDA – o que?
CINTIA – (confidencia pra amiga) or-gas-mos mul-ti-los.
AMANDA – (impressionada/pasma) Então isso existe mesmo?...
CÍNTIA – Claro! Claro que sim... amiga, é um negócio que vai subindo, um prazer... E eu tenho tanto medo que isso acabe que.... ai, eu nem saberia o que fazer se um dia...
VINI VOLTA COM A BEBIDA E BEIJA BEM A BOCA DE CÍNTIA, ALISA SEU CABELO, OLHOS NOS OLHOS CANTA, INTENSO, ENTREGUE, Trecho da música tema de Roberto Carlos, enquanto os carinhos se tornam mais calientes, incomodando a ainda estupefata AMANDA.
VINI canta: Eu quero ser sua canção, eu quero ser seu tom, me esfregar na sua boca ser o seu baton, o sabonete que te alisa embaixo do chuveiro, a toalha que desliza no seu corpo inteiro... (NESSE PONTO AMANDA NÃO AGUENTA MAIS E SOLTA UM CHORO -  eles param, se dão conta dela).
CÍNTIA – Amanda? O que foi?
AMANDA – Minha vida é uma merda!
CÍNTIA – Mas o que houve?
AMANDA -  Você arrumou esse homem perfeito aí só pra me afrontar!
VINI – Você tá bem?
AMANDA – (pra Vini) Vai tomar no cú! 
CÍNTIA – Mas que isso Amanda?
AMANDA – Esse homem lindo, lindo! Olha aí! Isso não se faz! Não se faz!  (bate no peito do vini,patética) Eu te odeio!
CÍNTIA: Mas amiga, você tem o Otávio...
AMANDA – (sai de cena gritando, possuída em sua dor) O Otávio é um brocha! Um brocha! Meu marido é um brocha!!! Eu me casei com um brocha! Um brocha! (sai)
SILÊNCIO. tempo
CÍNTIA – Parabéns. Você foi ótimo.
VINI –  É o meu trabalho.
CÍNTIA -  Eu já imaginava que você fosse bom até porque você foi caro. Eu tenho mania de achar que tudo que é caro é bom. (sorri) (tira discretamente o dinheiro da bolsa e conta) Tá aqui, ó, certinho. Toma. (ele olha, conta e devolve na mão dela)
VINI – Não quero.
CÍNTIA – Como assim?
VINI – Não paga.
CÍNTIA – que foi? Achou pouco? Mas foi o combinado.
VINI –Trabalho para mim é sagrado. Eu sou profissional compreende?  
CÍNTIA – Eu sei, mas esse foi o valor combinado.
VINI – São mais de 200 mulheres que eu ajudei...
CÍNTIA – Duzentas?
VINI – Que eu beijei, amei, dei atenção... mais de duzentas.
CÍNTIA – Eu sei que você tem muita experiência mas...
VINI – Mas nenhuma tinha o seu cheiro. Nem o seu gosto. Toda mulher tem um gosto, mas o seu é diferente. É um gosto de anis.
CÍNTIA – De que?
VINI – É doce e amargo ao mesmo tempo.  Compreende?
CÍNTIA – Doce?
VINI – E amargo. E tem outra. Eu gosto do seu jeito.
CÍNTIA – Que jeito?
VINI – Desajeitada.  É que você é desajeitada.
CÍNTIA - ...
VINI - Você roi a unha.
SILÊNCIO, ELA, INSCOSCIENTEMENTE, ESCONDE AS MÃOS.
VINI – Então com você vai ser de graça.
CÍNTIA – Vai ser... Oi?
(tempo, os dois se olhando) VINI - Vem aqui.
CÍNTIA – (se aproxima hesitante).
VINI – Com você eu posso ser quem eu sou, porque no fundo no fundo você é igual a mim.  (TEMPO) Vem cá, assim.  (fala, homem, no ouvido dela) Você agora vai ser a minha mulher, tá me ouvindo? E sabe por que? Por que você me quer, porque você sabe que eu não sou esses bananas que você encontra por aí.  Você não gosta quando eu te pego assim? (pegando no cabelo dela viril mas também carinhoso).
CÍNTIA – Ai, meu cabelo.
VINI – Você não gosta?
CÍNTIA – Se você não soltar meu cabelo agora eu vou gritar. Hein? Olha que eu grito.
VINI – Hum? Gosta ou não gosta? Fala.
CÍNTIA – Gosto.
VINI – Não ouvi.
CÍNTIA – Gosto.  Gosto sim. Eu gosto. Mas a gente é diferente.
VINI – (cheira o pescoço dela) Você tem cheiro de alecrim... (volta ao assunto) E daí?
CÍNTIA – E eu não me apaixono.  Tá me ouvindo? Nunca me apaixonei por ninguém.
VINI – Nem eu. Mas o amor quando acontece é assim. (se olham – enquanto entra a música do Roberto Carlos no trecho: eu quero ser a coisa boa, liberada e proibida, tudo em sua vida. SE BEIJAM e a música vai para: todo homem que sabe o que quer... sabe dar e querer da mulher, o melhor é fazer deste amor, o que come, o que bebe, o que dá e recebe...  a temperatura entre eles vai subindo, enquanto a luz vai cai.)
FIM
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A segunda cena mais votada da noite também está no youtube. Acesse o link, clicando aqui . E leia abaixo o texto na íntegra.
Detalhes
Leandro Muniz


HOMEM E MULHER NUMA ESPÉCIE DE AGÊNCIA DE PUBLICIDADE. MAS NÃO É OBRIGATÓRIO, PODE SER NUMA SALA QUALQUER. O IMPORTANTE É QUE ELES NÃO ESTEJAM EM CASA.


Mulher - Tem que ser com a música do Roberto Carlos?
Homem - Tem.

Pausa. Ficam pensando.

Mulher – Já sei. Um homem tocando violão na rua, ele vai andando, cantando “Detalhes”. Aí o trânsito para, as pessoas sorriem pra ele, até que vemos o carro.
Homem - Já não fizeram isso? Um cara tocando violão e andando pela rua? E se fosse um trio elétrico?
Mulher (ri) - Trio elétrico?
Homem - É. Passa um trio elétrico tocando um axé qualquer, multidão em volta. De repente, silêncio total. Surge um cara no carro com um phone de ouvido grande (mexe a cabeça, com as mãos no ouvido, simulando) cantando “Não adianta nem tentar me esquecer...”
Mulher - Acho brega. Meio desconexo. Por que a gente não bota umas imagens aéreas da estrada, a música rolando e uma família sorridente e feliz, meio “olha como somos um casal fofo que tem um carro incrível e viajamos com as crianças nas férias”.
Homem - Pode ser. (t) Não sei, parece meio ideia fácil, já vi em algum lugar...
Mulher - Se a gente ficar tentando ser cem por cento original, vamos ficar aqui até amanhã.
Homem - Ótimo, então a gente fica! Porque eu não vou colocar família “felizinha” viajando. Meu trabalho não é ser óbvio, Juliana!
Mulher - Mas o que você quer fazer? Acha tudo chato!
Homem - Eu acho que falta humor.
Mulher -. Mas a música não é engraçada.
Homem - Caguei, tem que ser fofo, legal e ter humor! Senão vai ser frustrante.
Mulher - Por que?
Homem - Porque a música é ótima, vão pensar: estragaram a música linda.
Mulher – Humor? Então faz assim. Põe um casal de anões namorando, se alisando carinhosamente. Um diz pro outro: detalhes tão pequenos de nós dois.
Homem - Juliana...
Mulher - Perdi a paciência, você é muito intolerante!
Homem - Seu sarcasmo não ajuda.
Mulher - Nenhuma ideia te agrada, mas você também não resolve. Assim é fácil ser chefe.
Homem - É assim que você me vê?
Mulher - Agora você já sabe!
Homem - É o fim ter intimidade.
Mulher - Poderia ser bom. Bastava você ser educado ao invés de estúpido, quando achasse uma ideia ruim.
Homem - Eu fui educado agora.
Mulher - Mas mais cedo quando eu disse que podia ser uma viagem de cruzeiro, com show do próprio Roberto Carlos rolando, e daí um homem via a foto do carrão e dizia: “preferia estar nesse carro ouvindo a música pelo rádio”. Você disse que a ideia era ridícula, que se eu não fosse sua esposa, você me demitia.
Homem – Era péssimo, mas eu tava brincando.
Mulher - Brincando o cacete.
Homem - Eu gosto quando você franze a testa quando tá nervosa.
Mulher - Eu gostava quando você era mais gentil. (suspira, sem paciência)
Homem - Gosto quando você dá esse suspiro como quem diz: “ai, Gabriel, Gabriel...”. Adoro.
Mulher - Eu quero me separar.
Homem - Gosto quando você tenta... O que?
Mulher - Me separar de você. Acabar com tudo, não quero mais viver junto, muito menos trabalhar com você.
Homem – O que que você tá dizendo?
Mulher – Que eu cansei de ser sua empregadinha em casa e sua secretariazinha aqui. Acabou! Eu quero romance, um homem que morra por mim, que não ache ridículo tudo o que eu falo, que trepe comigo quatro vezes na semana pelo menos, que me paparique, que seja suave, gentil, mas que tenha um tesão descontrolado quando necessário, que abra a porta do carro, que me dê presentes criativos, que tenha atenção voltada para as pequenas coisas, que torne cada minuto da nossa convivência inesquecível,  que me elogie, que pergunte como tá  a minha mãe, porque somos um casal fofo, com um carro incrível que viaja com os filhos nas férias. ( pausa) É, acho que é isso que eu quero.
Homem – Juliana...
Mulher – Mas você acha que isso parece meio ideia fácil, né? Que você já viu em algum lugar. Onde você viu?

JULIANA PEGA A BOLSA PRA IR EMBORA.

Homem - Você tá se demitindo?
Mulher - Sim, da agência e da vida conjugal.
Homem - É piada isso?
Mulher - Não tava faltando humor?

JULIANA VAI SAINDO.

Homem – Gosto quando você quer ir embora, mas não consegue. Gosto quando você percebe que não vai me encontrar em outro rapaz, por mais parecido comigo que ele seja. Gosto quando você desisti de ir, porque ama minhas grosserias tanto quanto minhas delicadezas.

ALDO COMEÇA A CANTAR AO FUNDO (“Não adianta nem tentar, me esquecer...”)

Homem – A música entra. A moça desiste de ir embora. Se vira para ele. (mulher se vira para Homem), larga a sua bolsa (mulher larga a bolsa no chão), ele diz que o que mais quer dessa vida é ter quarenta e sete filhos com ela (eles caminham um em direção ao outro), envelhecer paparicando essa mulher.
Mulher – Ela finge que acredita e começa a caminhar em sua direção, meio irresponsável.
Homem – Ele para com um carro em frente a ela, com os quarenta e sete filhos loiros e fofos no banco de trás. Ouvimos o ronco do calhambeque.
Mulher – Nós vamos pra São Pedro da Aldeia de novo? Ela pergunta.
Homem – Ele diz que não. Que eles vão até o aeroporto no carrão. E vão viajar pelo mundo inteiro.
Mulher – Com as quarenta e sete crianças?
Homem – Licença poética.
Mulher – Ela aceita e entra no carro.
Homem – Música aumenta. Locutor fala: Blader. O novo carro da Fox. Para quem ama de verdade.
Mulher – Meio óbvio.
Homem – Era isso que eu queria.

HOMEM SE APROXIMA DE MULHER. OS DOIS SE BEIJAM.
ALDO, CANTANDO, ANDA E PASSA POR ELES DURANTE A CENA. ELES PARAM DE SE BEIJAR E SORRIEM PRA ALDO. VOLTAM A SE BEIJAR, E PERMANECEM ATÉ QUE ELE ENCERRE A CANÇÃO.


BLACK OUT.