segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Palhinha da quarta passada, dia 18/11/2009 - Tema: Família

É ASSIM QUE TEM QUE SER
De: Renata Mizrahi

A cena dá idéia que é uma linda tarde de verão, numa daquelas cidades de casinhas, estilo americano, onde tudo é aparentemente calmo e harmônico. (Estilo Beleza americana) Mãe e filho estão no jardim numa dessas lindas casinhas comendo a mangas

Obs: Pode estar comendo outra coisa. Sugestão que comam algo que empapuça.
A imagem da mãe é daquelas mulheres que parecem estar sempre felizes, como se na vida não houvesse problemas, ou não querem vê-los.


FILHO (após um longo silêncio): Mamãe? Posso te fazer uma pergunta?

MÃE (feliz com sua manga docinha): Claro, meu filho.

FILHO: Por que você e o papai estão juntos?

MÃE (um pouco surpresa): Ué, filho, porque a mamãe e o papai são casados.

Filho: E por que vocês são casados?

MÃE (ainda mais surpresa): Ué, filho porque a mamãe gosta do papai e o papai gosta da mamãe.

FILHO: Gosta mesmo, mamãe?

MÃE: (um pouco constrangida com a pergunta): Claro, meu filho!

FILHO: Ah, Entendi. Então a gente casa com quem a gente gosta.

MÃE: Isso, filho. A gente casa com quem a gente gosta.

(Silêncio. Mãe volta a comer a manga e é mais uma vez surpreendida.)

FILHO: Então eu já sei com quem eu vou casar.

MÃE (com um pedaço de manga na boca): É mesmo, filho. Você já sabe? E com que o senhorzinho vai casar?

FILHO: Com o Ronaldo.

MÃE (engasgando com a manga): Por que com o Ronaldo?

FILHO: Porque eu gosto muito dele, mamãe. E eu sei que ele gosta de mim.

MÃE (cuspindo a manga): Não, meu filho. Você e o Ronaldo são amigos. Amizade é uma coisa, amor é outra.

FILHO: Ah, então é com ele mesmo que eu vou casar. A gente se ama de verdade, mamãe. Não é apenas uma simples amizade. Ele até desenhou um coração na minha blusa, ó.

(Ele mostra um coração desenhado na sua blusa. A mãe fica muito aflita.)

MÃE: Tira isso, meu filho! Tira isso!

FILHO: Por que, mamãe?

MÃE: Tira e não discute comigo!

FILHO: Mas...

MÃE: Tira!

(O filho tira a blusa sem entender por quê. Longo silêncio. Mãe se recupera.)

MÃE: Meu filho. Você não pode casar com o Ronaldo.

FILHO: Não?

MÃE: Não.

FILHO: Por quê?

MÃE: Por que o Ronaldo, meu filho, é homem, e você também é homem. E os homens só podem casar com as mulheres.

FILHO: Por quê?

MÃE (quase perdendo a paciência): Porque sim, meu filho. É assim que tem que ser.

FILHO: Por que é assim que tem que ser?

MÃE (cada vez com menos paciência): Porque é essa a sociedade que a gente vive.

FILHO: O que é sociedade, mamãe?

MÃE (já sem nenhuma paciência): Sociedade é um troço complicado que você não tem idade pra entender.

(Silêncio. O filho fica um pouco triste com o que disse a mãe. Os dois comem um pedaço de manga e mais uma vez a mãe é surpreendida)

FILHO: Mas, mamãe. Eu não amo nenhuma mulher. Eu amo o Ronaldo.

MÃE (recuperando a paciência): Meu filho, você ainda é muito pequeno. Ainda vai conhecer uma mulher que você ame muito e queira casar com ela.

FILHO: Mas e o Ronaldo?

MÃE: Também. O Ronaldo também vai conhecer uma mulher que ele ame muito e vai casar com ela.

FILHO: Puxa, mamãe. Eu não gostei da sociedade.

MÃE: Você é ainda é muito pequeno pra entender.

(Silêncio. Mãe acha que o assunto encerrou e, aliviada, coloca um grande pedaço de manga na boca. Até que mais uma vez é surpreendida)

FILHO: Ah! Eu já entendi!

MÃE (com a boca cheia de manga): Entendeu, meu filho? O quê?

FILHO: Eu vou mesmo me casar com uma mulher. Que nem o papai casou com você.

(Muito muito aliviada, mãe coloca mais um grande pedaço de manga na boca.)

MÃE: Que bom que você entendeu. Assim você vai ser muito mais feliz.

FILHO: Eu vou poder casar com uma mulher pra ser amante do Ronaldo, né mamãe?

MÃE (engasga com a manga): O que, meu filho? Você sabe o que é amante?

FILHO: Sei sim, mamãe. Amante é quando você ama de verdade uma pessoa, mas é casado com outra. Casamento a gente ama de mentira e amante a gente ama de verdade.

MÃE (engasgando mais com a manga): E onde você aprendeu isso, filho?

FILHO: Ué! Com você e com papai.

MÃE (engasgando mais): Comigo e com seu pai?

FILHO: É, mamãe. O papai é casado com você porque assim que tem que ser na sociedade, né?

MÃE (quase sem conseguir falar de tão engasgada): bem, não é bem assim...

FILHO: E é por isso que ele é amante do tio Silvio! Ah! Entendi!

(A mãe está engasgada com a manga, que cai de sua boca por toda parte, e fica completamente atônita.)

MÃE: O que, meu filho? Seu pai é amante do tio Silvio? Por que você está inventando isso?

FILHO: Eu não tô inventado, mamãe. Eu vi o papai e o tio Silvio de mãos dadas, um dia, quando eles foram me buscar na escola.

MÃE (quase morrendo): De mãos dadas?

FILHO: Igualzinho como eu fico com o Ronaldo.

(Mãe nos seus últimos segundos de vida começa a urrar.)

FILHO: Mamãe, tá tudo bem?

MÃE: Não, meu filho. Acho que a sua mãe ta morrendo.

FILHO: Já, mamãe? Não morre. Você ainda nem conheceu o Ronaldo...

(mãe morre engasgada)

FILHO: Mamãe! Não Morre! Mamãe, porque você morreu? O que foi que eu fiz? Mamãe!!!!!

(Filho começa a chorar como uma criança desprotegida)

FIM.

Vídeo da Cena

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DESGOSTO DE FILHA     de Oscar Calixto
A cena se divide em dois planos: Plano da narração e plano do passado. Quando um acontece o outro paralisa. Mesa de almoço. Família está reunida. Narradora invade o palco e se coloca.

NARRADORA
Alguns fatos da vida são muito engraçados. As pessoas te julgam sempre pelos seus atos. Eu sempre assumi os meus, nunca me esconde de nada. Talvez esse tenha sido meu erro, fui muito odiada. Certa vez, me lembro, estava cheia, escondia um fato que todos sabiam, mas ninguém falava. Então, nesse dia, na hora do almoço, resolvi contar. Sem o mínimo de rodeios me fiz falar:
Filha
Sou lésbica.
NARRADORA
Todos pararam, se olharam profundamente e continuaram a almoçar, como se nada tivesse acontecido. Meu pai respirou, como se sobre isso fosse falar, mas em três palavras desviou-me até do olhar:
Pai
Me passa o arroz?
Filho
Toma.
NARRADORA
Contribuindo para a quebra...
Filho
Pô, esse frango tá uma parada!

NARRADORA
Minha mãe estava calada, e eu de ódio definhava:
Filha
Não vão falar nada?
Pai
Sobre o quê?
Filha
Disse que sou lésbica!
NARRADORA
Todos pareciam dispersos, somente pararam, se olharam, respiraram e almoçaram.
TODOS PARAM, SE OLHAM, RESPIRAM E ALMOÇAM. PARALISAM A CENA.
NARRADORA
E em cena minha mãe agora entrava!
Mãe
Eu vou buscar a rabanada.
Pai
Está uma delícia essa salada, querida.
NARRADORA
Nesse momento eu entrei em crise, fiquei profundamente decepcionada. Minha amiga me disse que, quando contou, foi até expulsa de casa, e ali, de todos, ninguém me notava. Então, enfurecida eu disse:
Filha
Não vai buscar a rabanada!
NARRADORA
Todos novamente se olharam, respiraram e almoçaram.
TODOS FAZEM
NARRADORA
Minha mãe sentou e num descaso, acreditem, também almoçou.
Mãe
Me passa o feijão?
NARRADORA
Aquilo era completamente irreal para mim, eu não estava dizendo “quero água” ou coisa assim, era um caso sério, dizia em outras palavras “Esqueça o casamento, eu não dou pra nada”. E eles nem se quer ligaram, fingiram que não escutavam. Há essa altura eu não era mais eu, estava possessa, com o demônio na cara!
Filha
O que acontece com vocês? Estão malucos, surdos ou se fazem? Eu estou dizendo que sou lésbica, lés-bi-ca, gosto de mulher, colo velcro, bato chaminé! Ouviram?
NARRADORA
Todos pararam, respiraram, e novamente almoçaram.
TODOS FAZEM
NARRADORA
Eu não conseguia entender aquela atitude, em outras casas caía o mundo, na minha eles ficavam mudos! O que havia de errado? Não compreendia. Tinham combinado? Eu não sabia. Então, rapidamente, tentei atingir de outra forma:
Filha
Ô mãe, a Sandrinha vem aqui hoje.

NARRADORA
E pela primeira vez obtive um resultado:
Mãe
Mesmo, filha? Vem jantar?
NARRADORA
Boa deixa, agora eu ia mandar...
Filha
Vem dormir comigo, é ela a minha namorada.
NARRADORA
Yes, comemorava, afinal tinham me percebido. Mas foi em vão, sabe o que eles fizeram? (todos param, se olham, respiram e almoçam) Minha paciência foi pro inferno naquele momento, junto com todos os modos. Não era possível, de nenhuma maneira se manifestavam. Parecia que ficavam surdos e certas palavras não escutavam. Sabem o que eu fiz?
Filha (chora alto e revoltosamente)
Pai
Minha filha? Está chorando?
Mãe
O que houve, Gabi? Por que chora?
Filha (soluçando)
Eu estou dizendo que sou lésbica e vocês não dão a mínima!
NARRADORA
E só nesse momento me escutaram:
Mãe
Minha filha, nós já sabíamos, só não queríamos constrangê-la!
Pai
Nunca perguntamos...
NARRADORA
Fiquei perplexa, e soluçando, perguntei:
Filha
Já sabiam?
Mãe
Já!
Filha
E não dizem nada?
Mãe
Dizer o quê, minha filha? Não é essa a sua escolha? Nós queremos que seja feliz!
Filha
Verdade?
Pai
Verdade.
Mãe
Nós te amamos, querida!
NARRADORA
A Sandrinha veio, nós dormimos juntas duas semanas, até que foi legal, o clima era de paz e todos nos respeitavam. Mas um dia nós brigamos e o namoro acabamos, ela não voltou, e eu, claro, fugia dos meus pais como o diabo da cruz, mas um dia foi inevitável, nós almoçamos juntos e eles então perguntaram:

Pai
Gabi, a Sandrinha não veio mais, vocês brigaram?
NARRADORA
Eu prontamente respondi:
Filha
Brigamos, nós... terminamos.
Pai
Isso passa... Daqui a pouco estão de volta!
Filha
Não, nós não vamos voltar. Eu estou apaixonada... por um cara.
O irmão se engasga e tem uma crise de tosse, falta de ar...
NARRADORA
Depois do transtorno, todos se olharam, respiraram profundamente e almoçaram. Complementei dizendo:
Filha
E... nós vamos nos casar... Estou grávida.
Pai
O quê? Mas isso é um absurdo! Eu não acredito numa coisa dessas! Quem é o cara?
Mãe
Calma, Roberto!
Pai
Eu vou matar esse desgraçado! Fala... quem é o cara?

NARRADORA
E a casa caiu...
Pai (tirando o cinto)
Menina, você merece uma surra! Venha aqui!
Mãe
Calma Roberto!
Pai
Eu vou matar você também sua sem vergonha! Você não era lésbica, filha da mãe?
Mãe
Calma Roberto!
Venha aqui! Venha aqui!
NARRADORA
Ninguém é perfeito!

B.O. Gradual

Pai  (continua perseguindo a filha ao redor da mesa com um cinto nas mãos.)
Venha aqui! Venha aqui! Venha aqui!  Vou te dar umas boas lambadas pra você aprender sua Desgraçada! Venha aqui! Venha aqui! Venha aqui! Mãe solteira é? Venha aqui! Venha aqui! Venha aqui!


Vídeo da Cena

sábado, 21 de novembro de 2009

Sorteio para a próxima quarta, 25/11 - tema: AMIZADE

Resultado do sorteio para a próxima quarta, dia 25/11, no CLUBE DA CENA. Tema: Amizade!

Lembrando: é o último Clube da Cena do ano de 2009. Faremos uma pequena pausa e voltaremos em 2010 no teatro do Planetário da Gávea!

AUTORES                   -                  ATORES


OSCAR CALIXTO -  Luís Lobianco e Cláudio Amado
FÁBIO PORCHAT - Eber Inácio, Zé Guilherme Guimarães e Mariana Costa Pinto
LARISSA CÂMARA - Marino Rocha e Flávia Espírito Santo
JÔ BILAC - Renata Tobelem e Cecília Hoeltz
CRISTINA FAGUNDES - Thaís Lopes, Bia Guedes e Cacau Berredo
LEANDRO MUNIZ - Jorge Neves e Alexandre Barros
IVAN FERNANDES - Cristina Fagundes, João Rodrigo, Marcelo Dias e Mariana Consoli

domingo, 15 de novembro de 2009

Palhinha da quarta passada, dia 11/11/2009 - Tema: RIO 2016



NA LONA                                                                                      
de Cristina Fagundes

APARTAMENTO FEITO DE LONAS, TIPO INVASÃO DE PRÉDIO ABANDONADO

AURIMAR – Cadê minha calça, Gorete?

GORETE – E eu que vou saber Aurimar?

AURIMAR – Primeiro foi a minha bermuda agora é a minha calça, daqui a pouco é a minha blusa do flamengo.

GORETE – Calma Aurimar!

AURIMAR – Calma? Tão roubando a gente dentro de casa Gorete!

GORETE – Será que você não esqueceu essa calça em algum lugar?

AURIMAR – Daqui a pouco eu to pelado Gorete!

GORETE – Mas também calça pra quê? O verão ta chegando Aurimar.

AURIMAR – Eu falei pra gente não vir pra cá.

GORETE – Já vai começar de novo?

AURIMAR – A gente vai acabar sendo assassinado aqui. 

GORETE – Ai pára de drama Aurimar.

AURIMAR – A gente devia ter ficado lá em Madureira.  Isso aqui só tem bandido Gorete.

GORETE –É gente sem oportunidade. E pobre não é bandido Aurimar.

AURIMAR – Gorda, isso aqui é uma ocupação, é ilegal.

GORETE – Aurimar a gente ta no Brasil.

AURIMAR -  Aqui só tem vagabundo. 

GORETE – Por enquanto, mas isso vai mudar.

AURIMAR – E se não mudar? E se piorar?!

GORETE – Fala baixo Aurimar, vai acordar os vizinhos.

VIZINHO entra sem a menor cerimônia, abrindo uma das lonas.

VIZINHO – Aí, colchão maneiro hein? Pô, vou levar aqui rapidinho hein.

AURIMAR – Mas peraí, a gente vai...

VIZINHO – Aí, qual é? Vai ficar regulando mixaria pro teu vizinho? (mostra uma faca) Nem chegou e já que dá de patrão?

AURIMAR (com medo) Não, né isso não...

VIZINHO - Pô, to tentando uma interação e pã, mas pelo visto tu tá cum rei na barriga.

AURIMAR – Não num é isso, é que...

VIZINHO – Né não?

AURIMAR – Não, tá tudo.. tudo firmeza, ta tudo legal.

VIZINHO - Então ta beleza, já é. Vou passar aqui mais tarde com uma presença pra gente fumar então.  Fui. (sai levando o colchão).

AURIMAR – Você viu isso Gorete? Ele roubou nosso colchão!

GORETE – Ele só quer socializar Aurimar, vizinho é assim, pede sal...

AURIMAR -  Pede a tv...

GORETE - Ah, ele quer fazer amizade.

AURIMAR – Você viu como ele entrou? Nem bateu na porta.

GORETE – Que porta Aurimar? Num tem porta.

AURIMAR – Ai, meu deus...

GORETE – Mas que dificuldade de adaptação Aurimar. Francamente.

AURIMAR – Gorda, eu acho que eu não vou agüentar morar aqui.

GORETE – Aurimar, presta atenção.  Eu sei que é difícil, mas a gente tem que ser forte.

AURIMAR – Gorete, aqui não tem água, não tem banheiro.

GORETE – Você é muito negativo Aurimar.  Pensa só, agora você não vai nem precisar pagar academia, você sobe a escada com os baldes d´água e pronto.

AURIMAR -  Tão me cobrando pedágio para subir com a água.

GORETE – Quem?

AURIMAR – Uns travestis. 

GORETE – É o sindico e a família dele.  Foi no primeiro andar?

AURIMAR – Não, no quadragésimo sétimo.

GORETE – Que pena, já tava chegando aqui.  Bom, devem ser as regras do condomínio. Mas será que todo mundo tem que pagar?

AURIMAR – Teve um cara que não pagou.

GORETE – E então?

AURIMAR – Morreu.

GORETE – Como e que você sabe?

AURIMAR – Ele tava no lixo hoje de manhã.

GORETE – Hum... Ele podia ta dormindo.

AURIMAR – Tava cheio de mosca.

GORETE – Mas que homem porco, será que ele não toma banho?

AURIMAR – E as crianças peladas na escada?

GORETE – Criança não liga pra andar pelada Aurimar.

AURIMAR – Mas tinha uns adultos com elas.

GORETE – Ai, Aurimar, eles deviam ta brincando.

AURIMAR – Gorete, eu não agüento mais, a gente tem que ir embora daqui agora. 

GORETE – Calma Aurimar, calma. Olha, (fala baixo) presta atenção. Eu sei que é duro, eu também to sentindo falta de conforto, das minhas coisas, mas a gente tem que ter visão Aurimar. 

AURIMAR – Eu sei Gorda, mas é que...

GORETE: Deu no jornal, meu amor, a zona portuária vai ser totalmente revitalizada pras Olimpíadas.  O governo vai investir pesado nisso aqui.  Daqui há 6 anos isso aqui vai ta valendo ouro!  E a gente vai ta aqui! Isso tudo vai ser nosso!

AURIMAR – Será mesmo, Gordinha?

GORETE – Mas é claro Aurimar, isso aqui é a Barra do Futuro! Diz que vai ter até shopping Center e boliche e a gente vai ta no coração disso tudo, vamos ta por cima da carne seca! Vamos ficar ricos meu amor! 

AURIMAR – Mas como e que ninguém percebeu isso?

GORETE – Nem todo mundo tem visão Aurimar, as pessoas pensam pequeno. Tem que ter tutano pra sacar o que ta rolando. Tem que ter sagacidade.  Mas a gente sacou e agora vai ficar rico.   È só ter paciência.

AURIMAR – è... Rio 2016..

GORETE – Vamos ser os reis do Porto meu amor! Não vai ter pra ninguém!

AURIMAR – Mas a gente tem mesmo que morar com essa gente, gorda?

GORETE – Tudo tem um preço Aurimar. 

ENTRA UM PUTA NESSA HORA

PUTA – Aí, falando em preço, oi, eu sou a vizinha aí das parede de isopor com os desenho de piroca, não é que tem a Suelen que também tem as parede de isopor mas com uns palavrão desenhado. Daí não sou eu.  Eu sou a das piroquinha com asa. (mostra) A lá!  Ó!  Seguinte, to com uma promoção de pague frente e leve frente e trás e daí eu pensei que como a gente é vizinho né? ... (olha para Aurimar) tu quer fazer um teste pra ver? Sem compromisso?

AURIMAR – Um teste?

PUTA – É, pra dar uma avaliada no material, vai que tu gosta? Pega aqui pra tu sentir!

AURIMAR – Eu?

PUTA – È pega aqui, viu? E aqui então, ó? É coisa boa meu filho, filé!  Essa varize num conta que eu vou operar e vou tirar fora, mas di resto ta bom né? ... E aí vambora?  

AURIMAR – (OLHA PRA GORETE) Olha, é muita gentileza sua, mas é que eu sou...

GORETE – Vai Aurimar.

AURIMAR – Oi?

GORETE – Ela quer que você vá.

AURIMAR – Mas Gorda ela ta querendo...

GORETE –  Ela quer fazer amizade Aurimar, vai com ela.

PUTA – É logo ali, ó, naquele isopor, do lado daquele cara do crack.

AURIMAR – Aquilo ali é crack?

CHEGA O VIZINHO DE NOVO

VIZINHO  – Aí, trouxe o bagulho pra gente.  Esse é do bom!

AURIMAR – Bagulho?

GORETE – Ah, que gentil. 

AURIMAR – Gorete isso aí é maconha?

GORETE – Deixa que eu cuido disso Aurimar, agora vai que a moça ta te esperando.

AURIMAR –  Mas e você?

GORETE – Vou fazer sala pro... qual o seu nome?

VIZINHO – Picadinho.

GORETE – Picadinho, prazer.  Vai Aurimar. Anda!

PUTA – Borá ném!

AURIMAR – Picadinho...?

GORETE – Vai Aurimar! Pensa no Futuro! Rio 2016! (ele sai com a puta, relutante) (pro vizinho) Tamos gostando muito daqui.  Sua mulher mora aqui com você?

VIZINHO – Não, ela tá presa.

GORETE – Ah, sei...  Vou fazer um bolinho de cenoura então pra você levar ela...  Ela gosta de cenoura?
(a luz vai caindo e eles conversando).
 
fim


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Jogos - de Jô Bilac

personagens: Mike e Lola

(Mike e Lola, um casal diferente, sempre buscando novidades na vida sexual)
(os dois num parque de diversões particular)

Mike: O que foi Lola? Não está se divertindo...?

Lola: Ai, Mike... Parque de diversões me faz lembrar da nossa filhinha que foi para dysney e nunca mais voltou... Saudade dela!

Mike: Uma ingrata! Não gosto nem de lembrar...

Lola: Esses brinquedos todos! Essa alegria desenfreada! Essa  gente pobre com vontade de ser feliz. Me deprime. Manda eles embora?

Mike: (enxota) Vambora cambada! Sai! Todo mundo ralando! Bora, bora!!! Acabou a mamata! Vambora!!! Bora!!! Circulando, circulando!!!

(todos saem, Mike volta para a esposa)

Mike: está melhor agora, meu amor?

Lola: Não...

Mike: O que foi?

Lola: Ai...Tô com uma angústia sabe? Um negócio...

Mike: Quer destribuir dinheiro? Podemos!!! Ou então juntar meia dúzia de infortunados e sortear uma casa própria... O que acha? Podemos também.

Lola: Mike!!!... A gente sempre faz as mesmas coisas... A nossa vida anda muito sem sentido ultimamente...

Mike: E o que você quer que eu faça? Diz meu anjinho...

Lola: Eu quero uma coisa diferente... Mais humana sabe?

Mike: Pra que?

Lola: Ah...  Sei lá... Pra variar...Você não quer se sentir um ser humano melhor? Fazer o bem? Praticar coisas boas... Fazer algo realmente importante?

Mike: Lola, a gente faz isso o tempo todo...

Lola: Mas eu quero algo melhor...algo maior! algo realmente grandioso, sabe? algo como... hum...... algo como.... Os jogos olimpicos! Isso!

Mike: O que tem?

Lola: Os jogos Olimpicos de 2016! Bem que podia ser aqui em casa, hein...

Mike: Mas vai caber tanta gente?

Lola: Ah, a gente da um jeitinho... Faz uma farra! Hein, Mike! Não ia ser legal? Ter um monte de esportistas por aqui...suados...viris... lutando pelo ouro olímpico!

Mike: Hum...que excitante...

Lola: Seremos como os antigos imperadores romanos, com seus jogos de poder! Dando pão e circo ao nosso povo! Eles vão nos amar!

Mike: Já nos amam, meu amor, por nossa causa o Cristo é a sétima maravilha do mundo.

Lola: isso fichinha, Mike! Jornal de ontem! Notícia velha! Os jogos olímpicos sim é o que vai impressionar! Percebe? Entraremos nos anais  dessas pessoas.

Mike: Lolinha... Anais... Que delícia....

Lola: Isso sim seria divertido...

Mike: Mas 2016 está tão longe...Por que não transferimos logo? Pra que esperar até lá? Com uma ligação resolvo isso, quer ver?

Lola: Não, meu bebê. Agora não... precisamos de tempo para organizar tudo, não gosto de receber ninguém assim, de repente! Na bagunça! E além do mais essa cidade anda muito perigosa... Vai que, sei lá, tentam derrubar os helicópteros dos nossos visitantes...Vai ficar feio . Não pega bem... Vão nos achincalhar! Primeiro organizamos a casa e depois sim daremos a festa!

Mike: Lola, lola... O que seria da minha vida sem você?

Lola: Agora, vamos! Precisamos nos apressar. Tô sabendo que Madri tá querendo as olimpiadas por lá...

Mike: Mas é nunca! Com um telefonema resolvo isso!  A tocha olímpica será atochada aqui !

Lola: Ui, Mike...

Mike: O que foi, Lolinha?

Lola: é que esse papo de tocha, atochada, fogo olímpico, ai...me deixou com uma vontade!!!!

Mike: Vontade de que , héin...?

Lola: Ai, com uma vontade de treinar salto com vara...

Mike: Sério...?

Lola: Seríssimo!

Mike: Vamos providenciar essa vara agora!

Lola:  Hiroshima eu! Nagazaki você!


(se agarram num beijo violento)

fim



sábado, 14 de novembro de 2009

Sortei para a próxima quarta - 18/11/2009 - tema: Família

 Novo sorteio e os atores foram divididos da seguinte maneira para a próxima quarta:

Autores                                           -                                     Atores


IVAN FERNANDES - MARIANA COSTA PINTO e MARCELO DIAS
CRISTINA FAGUNDES - ZÉ AURO E CARINE KLIMECK
OSCAR CALIXTO - CLAUDIO AMADO E CECÍLIA HOELTZ
JÔ BILAC - RAUL FRANCO E BIA GUEDES
RENATA MIZRAHI - JOÃO RODRIGO E ANA CAROLINA
RAFAEL SPERLING - RENATO ALBUQUERQUE E ZE GUILHERME GUIMARÃES
LEANDRO MUNIZ - PRISCILA ASSUM E MARIANA SANTOS

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Oportunidade para Dramaturgos

O projeto Clube da Cena está selecionando semanalmente textos de dramaturgos de todo o Brasil para participar de espetáculo temático semanal no teatro Gláucio Gil.

Para participar basta enviar até segunda-feira, 16 de novembro, um esquete sobre o tema AMIZADE, de até 8 MINUTOS para cris1@ism.com.br

Os textos podem ser de comédia ou não. O esquete selecionado será encenado no dia 25 DE NOVEMBRO e o autor receberá um percentual de 1,5% do bruto da bilheteria deste dia.

Não percam! Toda quarta no teatro Gláucio Gil (Rua Arcoverde S/N - ao lado do Metrô - Copacabana - RJ)

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Palhinha da semana passada - dia 04/11 - tema: COMIDA

COZINHADO COM VOCÊ
De Claudio Torres Gonzaga

CENARIO DE UM PROGRAMA DE CULINÁRIA. UMA MESA. UMA FRIGIDEIRA ENORME (PODE SER A TAMPA DE UM LATÃO, QUE DEVE ESTAR ESCONDIDA), UM QUADRO NEGRO, UM TERMOMETRO AL;SKD VINHETA DO PROGRAMA.
VOZ OFF
E agora A cozinha fácil do Grande chef da cozinha catalã e mediterrânea Felipe Bertrand de la Croix Noiret.
CHEF ENTRA NO CENÁRIO. (SE O ATOR FOR CAPAZ DE FAZER UM BOM SOTAQUE FRANCÊS, VAI FICAR MELHOR. CASO CONTRÁRIO É MELHOR FAZER SEM SOTAQUE.
CHEF
Bom minha querida dona de casa, estamos começando mais um A cozinha fácil do Grande chef da cozinha catalã e mediterrânea Felipe Bertrand de la Croix Noiret. Como vocês sabem o nosso programa valoriza as receitas simples. Aquela comidinha do dia a dia. Receitas pra facilitar a sua vida. Hoje vamos aprender a fazer um ovo frito. Parece simples. E é simples, mas com algumas dicas e o equipamento certo você vai extrair o máximo prazer que um ovo frito pode proporcionar. Primeiro a frigideira certa. Para ovo ficar no ponto certo a frigideira deve ter 86.8 centímetros. (pega a frigideira) Claro que pode ser um pouco mais ou um pouco menos... 86.6 ou 86.9... tudo bem. Dá pra quebrar um galho. Se for outra medida o ovo vai se sentir sufocado. Como se ele nunca tivesse saído de dentro da galinha. Um ovo estressado. E ninguém quer comer um ovo estressado, certo? Depois é um importante calcular o centro preciso da frigideira pra que o ovo fique exatamente ali, para que o calor chegue uniformemente até ele. Isso é muito fácil. (vai até o quadro negro onde o gráfico já pode estar desenhado ou ele vai desenhando, mesmo que não faça muito sentido) Você só vai precisar de um compasso de arquiteto. Você traça a circunferência da frigideira, estabelece dois arcos de circunferência, dividir cada um em duas partes, traçar uma perpendicular ao ponto tangente de cada arco, prolongar as duas retas. O encontro dessa duas retas determina o centro da frigideira. Fácil, não é? Depois é só quebrar o ovo em cima desse ponto central. Claro que pra isso você precisa calcular a distancia entre o ovo e a frigideira levando em consideração a gravidade e viscosidade combinadas de clara e gema e o atrito. Mas isso eu não preciso demonstrar porque qualquer dona de casa sabe. Vamos averiguar a temperatura da frigideira, que não deve ser menos 79 graus, nem mais que 81. É só colocar um termômetro industrial de frigideira e deixar lá até ele atingir a temperatura ideal. Cuidado pois o termômetro não deve ficar bem passado e sim ao ponto. A quantidade de sal, essa sim, tem que ser precisa: 0.8 miligramas, ou se você preferir pode contar os grãos de sal: 202 grãos. Muito fácil. Agora nos já temos tudo pra fazer um legitimo e simples ovo frito: (vai mostrando as coisas) frigideira de 86.8 centímetros, um quadro negro, uma calculadora, um termômetro industrial, sal e... (procura o ovo) Uê cadê o ovo... devia estar aqui... Bom o ovo é só um detalhe. Semana que vem vamos fazer um bife. Preparem seus maçaricos. Até lá.

VINHETA DE ENCERRAMENTO.

FIM

Vídeo da Cena





O PERU
De Ivan Fernandes

1.

Mendes e Costa estão em um aviário. Olham as várias aves.

M – Mas é isso é que eu não entendo, Costa. Por que não comprar um peru congelado, como todo mundo faz?

C – Minha mulher diz que não é a mesma coisa. Meus sogros vão chegar do norte e ela quer impressionar na ceia de natal. E não dá pra discutir com minha mulher.

M – Mas por que tu me chamou aqui? E eu lá vou saber escolher um peru?

C – Mas vai me ajudar a carregar. Olha o tamanho do bicho.

M – Esse lugar parece um campo de concentração.

C – Eu não quero condenar ninguém à morte. Mas não dá pra discutir com minha mulher. Escolhe um aí.

M – Eu não. A ceia não é minha. A mulher não é minha.

C – Pra mim parecem todos iguais. (tapa os olhos) Mi – nha – mãe – man –dou – eu – es – co – lher – es – se – da – qui. (abre os olhos e olha pra ave apontada) É, meu amigo. Sobrou pra você. Até o natal tu vai ter uma vida de rei. Vai comer melhor do que eu. Vai ficar gordo. Depois... bom, depois da tempestade vem a bonança. Quer dizer, é ao contrário. (para o funcionário) Pode embrulhar. Vou levar esse aqui. Ah, não embrulha?


2.
Os dois carregam o peru pela rua.

M – Pô, Costa. Nem pra trazer o dinheiro do táxi?

C – E qual táxi ia aceitar a gente? Se nem no ônibus deixaram subir... anda, só falta uns dois quilômetros...

M – Mas tá um sol da porra... até o peru tá com os bofe pra fora. Bem que a gente podia parar pra tomar uma geladinha. Refazia as energias, e continuava.

C – Mas a minha mulher tá esperando o peru.

M – Uma só. Na sombra.

C – Então tá. Uma só, hein? Eu não quero discussão com a minha mulher. (sentam-se) Ô Bigode! Traz uma aê! E se a gente pedir mais uma, não sirva!

M – (para a platéia) Cerveja 1, cerveja 2, cerveja 3. (para Costa) Vamos pedir a conta?

 C- Ô Bigode! A saideira e a conta.

M – (para a platéia) Cerveja 7, cerveja 8, cerveja 9. (para Costa) Eu acho que esse peru tá meio estranho.

C – Parece meio triste.

M – Ânimo, peru!

C – Mas olha o que a gente tá fazendo. A gente é sem educação. Só a gente é que bebe. Ele deve tá triste porque a gente não ofereceu nada pra ele.

M – Que mancada!

C – Ô Bigode, traz uma branquinha aqui pro peru.

M – (para o peru) Tu gosta de whisky?

C – (para a platéia) Cerveja 12, cerveja 13, cerveja 14. (para Mendes) Ih, Mendes!

M – Que foi?

C – Hoje é a final do Mengão, esqueceu?

M – Puta que pariu! Vamo levar esse peru logo! Se não a gente não chega no Maraca a tempo!

C – Tá louco? Se eu aparecer na frente da minha mulher nesse estado, ela não vai me deixar ir ao jogo! E não dá pra discutir com a minha mulher. É melhor a gente ir ao jogo e depois levar o peru.

M – Mas como é que a gente vai entrar no Maraca com ele?

C – Ué, não deixam entrar urubu?

M – Isso foi antes.

C – A gente disfarça. Põe uma camisa do Flamengo nele e um óculos escuros. Ninguém vai notar.

M – Mas eu não aguento carregar ele até lá.

C – Ô Bigode! Arruma aí um carrinho de mão! E a conta! E a saideira!


3.
No Maraca. Narração de rádio de um gol do Flamengo. Som de torcida gritando gol. Costa e Mendes gritam e comemoram o gol do Flamengo, levantando o peru no ar.

C e M – É campeão! É campeão!

Ouvimos uma bateria de escola de samba. Eles sambam com o peru.

C – Pô, peru! Tu é o maior pé-quente.

 M – Tu é sangue bom. Pena que vai pra panela.

C – Eu não posso. A gente não pode fazer isso com ele.

M – A gente não. A ceia é tua, a mulher é tua.

C – Não é justo. Que vida que esse peru conheceu? Ficou preso naquele aviário e só. O que ele conhece do mundo? Ele ainda tem toda uma vida pela frente. Quanto tempo vive um peru?

M – Duzentos anos.

C – Isso é tartaruga.

M – Ah, é.

 C – Tanto faz. E agora tá condenado a morrer por causa de uma tradição idiota.

M - (para o peru) Eu nem gosto da sua carne. Eu nunca comi nenhum parente seu no natal.

C – Você não entende? Esse peru é um símbolo da gente. Que vida que a gente conhece? O que a gente conhece do mundo? Quanto tempo a gente ainda tem de vida?

M – Duzentos anos.

C – Isso é tartaruga.

M – Ah, é.

C – A gente precisa de um ato heróico. Algo que dê significado à nossa vida! Liberdade para os perus! Nós vamos jogar ele aqui de cima do Maraca.

M – Hein?

C - Tu não lembra quando eles soltaram um urubu que passou voando no campo?

M - Mas era um urubu, não era um peru.

C - É tudo a mesma coisa.

M – Então primeiro tira a faixa de campeão dele.

C – E a camisa também.

M –Mas é o manto sagrado!

C – Como é que ele vai voar de camisa? Prejudica a estrutura dos ossos. O movimento, entendeu?

M – Mas a gente vai soltar ele pra onde? Ele não tem pra onde ir!

C – A gente vai soltar ele de volta na natureza! Lá tem tudo que ele precisa!

M – Que natureza? Onde é que tem natureza por aqui? E tu já viu algum peru andando na natureza?

C – Por isso mesmo! Todos eles estão presos! A gente precisa sensibilizar as pessoas.

 M – Tá bom, mas e a tua mulher? Ela não vai se sensibilizar.

C – Justamente! Dane-se! Eu não obedeço mais! Ninguém! Vou aprender com os perus a ser livre!

M – É isso aí! Liberdade para os perus!

C – Me ajuda a desamarrar as pernas dele. Muito bem. (para o peru) Não precisa agradecer, amigo. Um dia a gente vai ser lembrado por isso, Mendes. (se prepara para arremessar o peru)

M – Peraí! Pra que lado tá o vento?

C – Isso importa?

M – Deve importar.

C – Tu já viu algum passarinho molhando a ponta da asa no bico e esticando pra sentir a direção do vento?

M – Não.

C – Então é porque não tem importância nenhuma.

 M – (para o peru) Olha, tu se esconde aí em algum lugar até passar o natal. Depois a barra fica mais tranquila.

C – É isso aí! Agora voa peru! Voa pra liberdade!

(jogam o peru. Acompanham com a cabeça o peru despencar e se arrebentar lá embaixo. Olham-se frustrados)

C – (desolado) Pô! Peru não voa?





sábado, 7 de novembro de 2009

Sorteio da quarta quem vem, dia 11/11 - tema : RIO 2016

Na semana que vem, o Clube da Cena apresentará 7 cenas diferentes sobre o tema Rio 2016.

Para isso, o elenco MAR foi dividido, através de sorteio, em 7 duplas. E cada dupla ficará responsável por transformar em cena cada um dos 7 textos escritos.

Veja abaixo o resultado do sorteio.

Autor                                   -                                            Atores

CLAUDIO TORRES - Eber Inácio e Mariana Consoli
CRISTINA FAGUNDES - Jorge Neves e Flávia Espírito Santo
IVAN FERNANDES - Marcelo Dias e Cecília Hoeltz
LEANDRO MUNIZ - Cristina Fagundes e Renata Tobelem
JOÃO RODRIGO - Cacau Berredo e Luís Lobianco
FABIO PORCHAT - Marino Rocha e Thaís Lopes
JÔ BILAC - Alexandre Barros e Mariana Costa Pinto.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Palhinha do espetáculo de quarta passada - dia 28/10 - tema FESTA


FESTINHA ANIMADA
De Claudio Torres Gonzaga

SALA DE UMA CASA DE RICO. KIKA, UMA SOCIALITE, ESTÁ  COM VERINHA, UMA PROMOTER, ORGANIZANDO UMA FESTA. ELA TEM QUE SER MUITO CHIQUE E SOFISTICADA. VERINHA ESTÁ ESPERANDO E KIKA CHEGA.

ATENÇÃO!! O TEXTO TEM BAIXARIAS DE TODOS OS TIPOS E TAMANHO. ELE DEVE SER DITO COM A MAIOR ELEGÂNCIA POSSÍVEL. COMO SE REALMENTE FOSSE UMA CONVERSA DE GRANFINAS.
KIKA
Oi Verinha. Você sabe que você é a promoter sensação do momento?
verinha
Tento fazer o meu trabalho o melhor possível.
kika
Lola Bragança e Bragança, falou maravilhas de você. Amou o último evento que você organizou pra ela.
verinha
A Lola é muito...
kika
(ATROPELA) Uma fofa, pois é. Eu te chamei pra me ajudar em mais um evento. Eu acabei de colocar um silicone e vou dar uma festinha para apresentar ele pra sociedade. Um open teta.
verinha
Que ótimo. Quantos ml?
kika
Porque você quer saber?
verinha
É que eu calculo os convidados em função dos ml. Uma base de 15 convidados por 100 ml
kika
Então é festinha pra mais cem. Veja se Kika Linhares é mulher de abrir os salões pra inaugurar muchiba?
verinha
Claro que não. Eu só perguntei pra saber o tipo de festa. Brunch, jantar, cocktail...
kika
Suruba.
verinha
Que ótimo! (anotando) Suruba pra 100 convidados...
kika
101. Suruba tem que ser impar, se não vira casalzinho. Um tédio.
verinha
Eu sei, 100 foi só um jeito de falar. Já tem a lista de convidados?
kika
Já, só preciso tirar umas dúvidas. Qual o tamanho do pau do Almedinha Braga?
verinha
(vendo o seu caderninho) Deixa eu ver aqui... 17 cm.
kika
Então confirma. Mas é o mínimo. Não quero mixaria de piroca na minha suruba.
verinha
Eu posso estabelecer esse limite, mas eu acho que uma pimbinha as vezes se faz necessário. A Duda de Albuquerque tem um cu apertadíssimo e ela adora um anal.
kika
É verdade! E se ela não der aquele brioco, vai sair falando mal da minha suruba. No dia seguinte está em todas colunas.
verinha
Vou chamar o Thiago Lima e Silva.
kika
Aí também não! O Thiago tem o menor pau do jockey Clube. O pau é tão pequeno que tinha que ser igual xícara. Tinha que vir com asa, porque ou você segura, ou chupa. Os dois ao mesmo tempo não dá.
verinha
Realmente. Pode deixar que eu arrumo um pouca pica na medida.
KIKA
Pequena mas firme. Pra foda de cu pau tem que estar tinindo. Se não chega na beirola incha e não entra!
verinha
Anão? Vai querer um anão? Anão em suruba é o ultimo grito.
kika
Claro. Quero um anão besuntado de mel.  Anão sem cobertura é muito 2007.
verinha
Eu sempre prefiro perguntar antes... posso chamar o Inacinho Perez?
kika
Gente! Aquele homem é um jegue. Ele pode vir mas vai ter que amarrar uma toalha na base pra fazer um gabarito. Se aquele mastruço avergalhado entrar todo, empala uma pessoa.
verinha
Eu pensei chamar ele porque a Lu Bezerra de Castro sempre vem.
kika
Aquela mulher é um túnel Rebouças. Ali cabe de um tudo, realmente pra preencher aquele espaço, só o Inacinho. Meu marido perdeu um anel lá dentro.
verinha
Eu sei, quem achou foi o Otavinho Meireles. Tava perto de um relógio, que até agora não apareceu o dono.
kika
Claro que não! Era de Rolex de camelô! Foi um escândalo. Essa gente não se dá ao respeito.
verinha
Homossexualismo?
kika
Discreto. No máximo um fio terra. Alias, unhas aparadas em geral e pouco pentelho. O meu persa está com pentelho da Estelinha Moura Brito desde da última suruba.
verinha
Mais algum detalhe?
kika
Só mais uma coisa. Nenhum silicone maior que o meu!
verinha
Eu posso ver como ficou?
kika
Pirou? Você quer que eu mostre o meu peito assim? Tá pensando que eu sou puta!
fim





Eu (Não) Gostei que Você Veio.
De: Renata Mizrahi
Para o Clube da Cena
Tema : Festa


(Duas atrizes para a mesma personagem: Paula 1 – A personagem real. Paula 2 – uma espécie de consciência . Elas conversam como se fossem duas pessoas diferentes.)


Paula 1 e Paula 2 estão em sua festa de aniversário. Elas dançam




Paula 1: To achando ele vem.
PAULA2: Ele não vem.
PAULA1: Ele vem. Eu sinto. Eu sempre sinto isso quando ele tá para aparecer.
PAULA2: Ele não vem. Não foi convidado. É a minha festa. Não vem.
PAULA1: Será que ele vem?
PAULA2: Ele não vem.
PAULA1: Ele não vem?
PAULA2: ele não vem.
PAULA1: Então ele não vem.
PAULA1: Não vem.
PAULA2: Não vem.

(silêncio)

PAULA1: Mas também se ele vier...
PAULA2: Se ele vier...
PAULA1: Se ele vier...
Paula1: Se ele vier...
PAULA2: Eu vou ignorar
PAULA1: Talvez conversar com ele só um pouquinho.
PAULA2; Ignorar.
PAULA1; Mas ele não merece.
Paula2: Não merece.
Paula1: Não merece a minha atenção.
PAULA2: Não merece.
PAULA1: Tá decidido.
PAULA2: Fora de questão.
PAULA1: Eu vou.
PAULA2: Fora de questão.
Paula1: Não merece.

(aparece Ele)

Ele: Paula?

PAULA2: Ele veio!
PAULA1: Não acredito.
PAULA2: Não era pra ter vindo.
PAULA1 (para Ele): Oiiii!
PAULA2: Seu safado. Como você teve coragem...
PAULA1: Que bom que você veio.
PAULA2: Você devia ter vergonha nessa cara.
PAULA1: Eu não esperava!
Paula2: Eu não esperava isso de você.
PAULA1: Fiquei surpresa!
PAULA2: Fiquei surpresa!

Ele: Pois é... eu achei que seria bom te ver nesse dia...

Paula2: Cretino.
PAULA1: É mesmo?
PAULA2: Eu te desprezo.


Ele: Tem tanto tempo que a gente não se vê, e eu achei que essa seria uma boa ocasião.

PAULA1: Eu tava com saudade.
PAULA2: Por que não morre?

Ele: Então eu fiz bem.

PAULA1: Fez sim.
Paula2: Obvio que não, seu cara de pau.

Ele: Afinal. Quem diria? 30 anos.

PAULA2: Graças a Deus, livre de você.
PAULA1: Pois é. Quem diria. eu tô aqui...
PAULA2: louca pra cuspir na tua cara
PAULA1: Bem feliz.

Ele: Feliz e linda.

Paula2: Pensou que eu ia virar um bucho?
PAULA1: Imagina.
PAULA2: To muito melhor agora.
PAULA1: Obrigada.

Ele: Linda, linda, linda!

PAULA2: Você não presta...
PAULA1: Você é um sedutor.
PAULA2: Um sedutor filho da puta

Ele: Eu trouxe um presentinho.

PAULA1: Jura?
PAULA2: Eu não quero.
PAULA1: Obrigada
PAULA2: Enfia naquele lugar
PAULA1: Obrigada.

Ele: Tá aqui (ele mostra o presente e ela pega)

PAULA1: O que deve ser?
PAULA2: Eu vou jogar fora

Ele: Abre.

PAULA1: Agora?
(ela vai abrir, mas desiste)
PAULA2: De jeito nenhum.

Ele: Abre...

(ela luta com ela mesma para abrir)

Ele: Tá tudo bem?

PAULA1: Só um instantinho.

(Paula 1 e Paula 2 vão para o outro lado)

PAULA1: Eu quero abrir,
PAULA2: mentira. Eu não quero abrir.
PAULA1: Quero saber o que é.
PAULA2:  Não quero saber.
PAULA1: Ele veio...
PAULA2: Mas eu não gostei
PAULA1: Ele veio...
PAULA2: Não devia ter vindo.
PAULA1: Veio...
PAULA2: Eu odeio ele
PAULA1: Não transo há seis meses
PAULA2: Eu não vou ser fraca
PAULA1: Eles se arrumou todo
PAULA2: Não dessa vez. Cansei de ser otária.
PAULA1: Quem sabe se arrependeu?
PAULA2: Vou mandar ele ir embora.
PAULA1: Não!
PAULA2: Sim!
PAULA1: Não!
PAULA2: Sim!

(Ele vai até elas)

Ele: Desculpa, mas tá tudo bem mesmo?

(PAULA1 e PAULA2 ao mesmo tempo)

PAULA1: Tudo ótimo!
PAULA2: Tudo péssimo!

Ele: Não vai abrir o presentinho?

PAULA1: Sim.
PAULA2: Não.
PAULA1: Si.
PAULA2: Não

Ele: Então abre.

PAULA1: Sim.
PAULA2: Não.
PAULA1: Sim.
PAULA2: Não!

(PAULA2 pega o presente da mão de PAULA1 e joga longe)

Ele: O que é isso.
PAULA Desculpa. Caiu.

(PAULA1 vai pegar o presente. Enquanto ela vai, PAULA2 fica cara a cara com Ele. Ela fala, mas ele não escuta)

PAULA2: Olha aqui seu babaca pedante. Paciência tem limite. Eu aceitei muita coisa de você, mas se você pensa que pode vir aqui na minha festa sem ser convidado e me persuadir com esse charme de quinta, você...

(PAULA1 puxa PAULA2 para o lado)

PAULA1: Você foi muito simpático de ter vindo.

Ele: Na verdade, eu fiquei um pouco assim, assim, afinal eu não fui...

PAULA1: Deixa... Eu fiquei feliz mesmo assim
PAULA2: Idiota, eu sou uma idiota.

Ele: Eu preparei uma festa a dois pra gente...

PAULA1: É?
PAULA2: Quer saber? Cansei . Cansei. Cansei. (fala para Ele e PAULA1) Vai embora daqui. E me deixa vencer.

PAULA1: O quê?

Ele: “ O quê” O quê?

PAULA2: Você ouviu muito bem. Vai embora! Anda! Vai embora. O que você quer? Fala a verdade. O que você quer?
PAULA1: Eu quero...
PAULA2 e Ele: O que você quer?
PAULA1: Eu quero...
PAULA2 e Ele: Fala.
PAULA1: Eu quero...
PAULA2: Fala logo. Deixa de ser covarde. Eu quero que ele vá embora. Eu quero isso. Eu quero!
Ele: Oi?
PAULA1: Eu quero que você vá embora.
Ele: Sério?
PAULA1 e PAULA2: Sério.
Ele: Você quer que eu vá embora?
PAULA1 e Paula2: Quero.
Ele: Mas você nem abriu o meu presente...
PAULA1 e PAULA2: Não. Toma esse presente (PAULA1 devolve o presente pra ele)
Ele: jura?
PAULA1 e PAULA2: Juro.
Ele: Puxa...
PAULA1 e PAULA2: Vai logo, por favor. É melhor assim. Vai...

(silêncio. Ele vai embora. Silêncio)

PAULA1 e PAULA2: Eu consegui! Eu consegui! (se abraçam) Ele foi embora! Eu consegui.

PAULA2: Finalmente eu venci.
PAULA1: Finalmente.
PAULA2: daqui pra frente eu assumo.
PAULA1: É vai ser melhor pra mim. Obrigada
(elas se abraçam)
PAULA2: será que eu já posso?
PAULA1: quer testar?
PAULA2: garçom!
PAULA1: Uma coca cola.
PAULA2: Tem suco de laranja?
Voz do garçom: Suco de laranja, tem sim.
PAULA1: eu não quero.
PAULA2: me dá um por favor.
Voz do garçom. Vou buscar.
PAULA1: Parabéns
PAULA2: Obrigada.
PAULA1: Até.
PAULA2: Até.

(PAULA1 vai embora. PAULA2 começa dançar feliz e aliviada. Entra uma outra atriz que faz a PAULA 3. Ela vem chorando.)

PAULA2: O que aconteceu?

P3: Eu não sei se eu fiz a coisa certa.

PAULA2 olha para PAULA 3.


FIM.




terça-feira, 27 de outubro de 2009

Nova oportunidade para autores



Atenção!

O Clube da Cena mais uma vez está abrindo oportunidade de participação para dramaturgos de todo o Brasil.

Para participar, basta enviar um texto de até 7 minutos de duração sobre o tema FAMÍLIA até segunda, dia 02/11, mencionando o nome da cidade e Estado.

Os textos selecionados serão encenados e os seus autores receberão 1,5 % do bruto da bilheteria do dia.

Aguardamos vocês!

Palinha do espetáculo de quarta passada - dia 21/10 - tema Vizinho


Do Amor                                                                           
de Cristina Fagundes

Música suave.
Um velho do lado esquerdo do palco e uma velha do lado direito, falam com a platéia.  È tudo muito suave, num tom de intimidade.

VELHO: A primeira vez que eu vi a Maria Flor foi numa festa, na casa do Ernesto,.  (música de bossa nova), ela tava dançando... Ela tava linda! Tava com os cabelos soltos, como ela usava naquela época.

VELHA: Eu estava com as sandálias francesas da mamãe...

VELHO: Eu fiquei hipnotizado por ela.

VELHA: Eu nem notei o Otávio.

VELHO: Fiquei observando-a de longe a noite inteira. 

VELHA: Fiquei conversando com os meus amigos a noite inteira.

VELHO: Ela era o centro da roda. Sempre. Acho que era o sorriso dela. Seu sorriso era a luz e nós éramos as moscas.

VELHA: Eu tava tão feliz! Eu tinha acabado de dirigir minha primeira peça e tinha saído uma crítica maravilhosa justamente naquele dia.

VELHO: Tinha muita gente importante na festa, artistas, intelectuais... E todos os homens de olho nela.  Chamavam-na pra dançar, traziam drinks, paqueravam.

VELHA: Mas eu só queria me divertir, eu tava leve. 

VELHO: Eu queria me aproximar mas não tinha coragem.  Na verdade eu não achava que nada em mim pudesse interessá-la.  Eu era muito duro naquela época e se a grana era pouca, a auto-estima então, era menor ainda.

VELHA: A noite foi passando e os rapazes foram ficando mais insistentes e mais entediantes também.

VELHO: Lá pelas tantas eu desisti de vez de me aproximar e resolvi descontar a minha covardia na bebida.  A bebida é a melhor amiga dos covardes.  Bebi todas. 

VELHA: Finalmente chegou a hora do violão. Sempre rolava uma rodinha de violão nas madrugadas do Ernesto.  Ah, era tão bom! (seria legal a atriz cantar Chico ou algo de bossa nova)

VELHO: Meu Deus, ela ainda cantava! Puta merda e agora?  Num impulso ébrio eu resolvi que ia pegá-la nos braços e levá-la comigo pra casa, cantando. 

VELHA: O Otávio surgiu no meio da roda, me puxou pela mão e...

VELHO: Eu vomitei, vomitei toda a minha covardia misturada com cuba libre em cima dela.  A roda parou, a festa parou, o violão calou e eu queria morrer.

VELHA: Ele ficou tão envergonhado, coitado. Pediu desculpas.  Disse que só queria me conhecer e que...

VELHO: ... (pra ela ) eu não devia ter bebido tanto, mas você, você é linda demais, poxa, assim até ofende! E eu... e eu sou um Zé ninguém. Eu sou a mosca, compreende? A mosca! (volta ao presente)  Falei pra ela o que me roía a alma. 

VELHA: Ele enrolava a língua, guaguejava, tão frágil... e eu me apaixonei.  Pela primeira vez na minha vida eu me apaixonei.

VELHO: Ela ficou ali me olhando e eu só queria sumir dali.

VELHA: Peguei o Otávio pela mão e o levei para o banheiro.  Limpei-o com um cuidado apaixonado. Dei-lhe água para beber e dei-lhe também nosso primeiro beijo. Na boca.  Naquela mesma noite começamos a namorar.

VELHO: Namorar a Maria Flor era o sonho de qualquer rapaz.  E eu tinha sido o escolhido. Mas eu não conseguia entender o que ela tinha visto em mim.
Às vezes eu me pegava de boca aberta, olhando pra ela.

VELHA: Passado um mês eu descobri: Otávio era o homem da minha vida.  Fui ter uma conversa franca com Otávio.  (para ele) Eu quero me casar com você Otávio. Quero passar a vida ao seu lado.

VELHO: Mas por quê?

VELHA: Não sei. Eu simplesmente quero.

VELHO: E então eu compreendi.  Não podia ficar com Maria Flor nem mais um dia. Ela era perfeita, perfeita demais pra mim.   Ela era a luz e eu era a mosca.  E sempre seria assim. Acabei tudo ali mesmo e me afastei.

VELHA: Emagreci a olhos vistos, não conseguia mais viver sem ele.  O amor vicia.

VELHO: Me mudei para Belo Horizonte, queria ficar distante de qualquer notícia dela.  De qualquer traço do seu perfume.

VELHA: Eu chorei, chorei meses, anos.  E fiz o que todo mundo faz quando é abandonado.  Pensei no que eu ia fazer no dia em que ficasse cara a cara com ele.  Me imaginei linda, bem-casada, com filhos, eu ia sorrir e dizer que era a mulher mais feliz do mundo sem ele.  Otávio me olharia triste, como um cão abandonado e me diria que tinha se arrependido.  Mas agora era tarde.

VELHO: Todas as noites, antes de dormir eu me perguntava como ela estaria.  Mais linda ainda, certamente, a cada dia mais linda, mais cheia de vida, mais cheia de admiradores. A esta altura já devia estar casada com algum doutor e talvez até com filhos.

VELHA: Planejei vinganças. Passaria direto por ele, nem o cumprimentaria.   Canalha, como é que ele me deixava assim, como quem joga fora um lápis?

VELHO: Os anos foram passando...

VELHA: E eu vivi a minha vida...

VELHO:  sem grandes alegrias nem tristezas...

VELHA: uma vida morna.

VELHO:  Mas um dia, 40 anos depois daquela festa, eu fui ao Rio resolver um assunto de herança e na volta, ao me sentar no avião, um choque, quem estava na poltrona vizinha?  Maria Flor. Ela dormia, dormia profundamente, na poltrona vizinha à minha.

VELHA: Eu tava muito cansada, tava voltando com toda a minha mudança de São Paulo. Assim que entrei no avião, adormeci. 

VELHO: Passei a viagem toda olhando para ela. Ouvia sua respiração. Sentia seu perfume. O mesmo perfume de tantos anos atrás.  Tantas vezes pensei em como seria encontrá-la novamente, imaginava-a ao lado de seu marido ou com amigos rindo ou cantando, como na festa.  Nunca assim, dormindo, nunca assim desamparada.  Tão abatida, tão frágil. 

VELHA: Eu estava me separando de um marido que nunca amei.

VELHO: Maria Flor sempre foi para mim uma força da natureza, uma fortaleza, inexpugnável. Nunca imaginei, nem por um segundo, que pudesse vê-la assim indefesa, vulnerável.  Nesse momento, o avião teve uma  pequena turbulência e sua cabeça pousou suavemente em meu ombro, adormecida.    Então, depois de todos esses anos, eu finalmente compreendi.    Maria Flor precisava de mim. 

(opcional) VELHA: E desse dia em diante, minha cabeça nunca mais saiu daqui. 


Música bonita.  Luz cai suavemente. Fim.




O Telhado - de Oscar Calixto

(Um casal extremamente simpático aguarda atendimento numa clínica. Ele insinua-se para ela e ela o corresponde timidamente. Percebem-se quase que sem querer que um ou outro note que se observam . Ficam nisso durante um tempo até que ele deixe escapar a primeira frase.)


Norberto
Sabia que você é interessante?

Dagmar
Interessante?

Norberto
É, interessante!

Dagmar
Interessante como?

Norberto
Ah, Interessante, ué...

Dagmar (cheia de si)
Ah! Você também é... Interessante!

Norberto
Ah! Obrigado!

(Silêncio)

Norberto
Estranha a demora, não é?

Dagmar
Clínica barata!

Norberto
É... Tem razão. Você é de onde, mesmo?

Dagmar
Sou do Rio e você?

Norberto
Sou de Sampa.


Dagmar
Olha...

Norberto
Longe, né?

Dagmar
Que nada! De avião é um pulo! Metrópoles vizinhas!

Norberto
É.

Dagmar
São Paulo! Interessante! (pausa) São Paulo é tudo!

Norberto (rindo)
É sim... É bem bacana... Mas eu adoro o Rio.

Dagmar
Mesmo?

Norberto
Adoro. Pra mim, o Rio que é tudo!

Dagmar
E por que?

Norberto
As mulheres são mais bonitas!

Dagmar (totalmente sem graça)
Ah...

(Silêncio. Ambos ficam meio constrangidos)

Norberto
Desculpa te perguntar, mas... Você veio se consultar aqui por quê?

Dagmar
Falta de dinheiro.

Norberto
Mas você tem o que? Assim... Fisicamente?

Dagmar
De doença, você fala?

Norberto
É.

Dagmar
Nada! Exame de rotina... Colesterol, glicose, hemograma...  Besteira minha! Cuidados... Sabe como é...

Norberto
Ah... Que bom então, né?

Dagmar
É.

(Pausa)

Norberto
Cara, eu queria te falar uma coisa desde que você chegou, mas... eu não tive coragem! Mas agora que começamos um assunto, acho que fico mais à vontade...

Dagmar
Então fala, ué...

Norberto
Sabia que seus olhos são lindos?

Dagmar
Ah! Obrigada.

Norberto
São mesmo! Bem bonitos! São verdes, né?

Dagmar
É são assim meio Furta-cor, sabe?! Eles mudam. No verão ficam meio que azul.

Norberto
Sei... (pausa) Chega aí... (Fazendo sinal para que ela chegue mais perto. Ela chega.) É... Já te aconteceu de você estar num lugar diferente assim, tipo uma clínica e... desejar uma outra pessoa?

Dagmar
Não. Por que a pergunta?

Norberto
É por que está acontecendo comigo agora, entendeu?

Dagmar (Gostando, mas totalmente sem graça)
Está falando sério?

Norberto
Estou.

Dagmar
Olha! Interessante! Diferente, né? Numa clínica!

Norberto
É... é sim... é... Bem louco isso!

(Pausa)

Dagmar (chamando-o também. Ele se aproxima.)
Ai... Posso te confessar uma coisa?

Norberto
Pode, claro!

Dagmar
Eu menti pra você!

Norberto
O que... Você não é do Rio?

Dagmar
Não!

Norberto
Você usa lente!

Dagmar
Não! É que... Está acontecendo isso comigo agora também, entendeu?

Norberto
Ah, Olha... Interessante! E o que a gente faz com isso?

Dagmar
Não sei...

(Silêncio. Pausa longa... Eles se olham... riem um para o outro e desviando o olhar...)

Norberto
Acho que vai demorar até sermos atendidos!

Dagmar
Vai.

Norberto
A gente bem que poderia dar uma saidinha, né? O que você acha?

Dagmar
Ah, eu acho que não há mal... Pode ser interessante!

Norberto
Também acho! Vamos?

Dagmar
Mas aonde?

Norberto
Ali, no telhado!

Dagmar
No telhado?

Norberto
É.

Dagmar
Não é perigoso?

Norberto
Bom, aí Depende, né?!

Dagmar
Depende de que?

Norberto
Se a gente se segura... Né?

Dagmar
Hum... Entendi...

Norberto
Então? Vamos?

(Esquecendo a tímida e apostando na ousada:)

Dagmar
Vamos sim. Vamos.

Norberto (Em tom de segredo e terminando quase que com mais gestos que fala)
Tá bom, então... Olha só: Eu acho que tem muita gente aqui, reparando no nosso papo sabe? Então... Eu vou primeiro... depois você vai, tá??!
Dagmar
Tá bom, eu vou... Pode deixar! Tchau!

Norberto
Tchau!

(Ela disfarça um pouco com a pessoa mais próxima da platéia. Fala do Clima, ou de algo que aconteceu no dia a dia da cidade... Depois dá uma desculpa qualquer, se despede e ao som de uma música faz o percurso até o telhado. No telhado, eles se olham, se abraçam, ajudam-se no equilíbrio e procuram o sexo em lugar poético e incomum. Ao fim disto, deitam-se no chão, um de frente ao outro.)

Dagmar (eufórica)
Ai, essa foi a coisa mais louca que eu já fiz na vida!

Norberto
Eu também.

Dagmar
Tão bom fazer essas coisas no telhado! Nunca fiz.

Norberto
Nem eu.

Dagmar
Assim à luz do dia... No começo fiquei receosa. Mas depois não... Você me segurou muito! Nem tive medo de cair.

Norberto
Se caísse não teria problema!

Dagmar
Como assim?

Norberto
Não dá pra morrer.

Dagmar
É, mas eu me machucaria! Eu Acho. Ai, mas foi tão bom... Eu estava de olho em você desde a sua chegada!

Norberto
Verdade?

Dagmar
Verdade! Eu acredito em amor à primeira vista, e você?


Norberto
Eu não.

(Extremamente Delicada)

Dagmar
E se eu te disser que estou apaixonada?

Norberto
Apaixonada...

Dagmar
É sim, apaixonada! (Sentando-se) Quer casar comigo?

Norberto (Sentando-se)
Não.

Dagmar
Por quê?

Norberto
Porque você é burra!

Dagmar
Burra?

Norberto
Burra!

Dagmar
Eu não sou burra!

Norberto
É sim.

Dagmar
Não, eu não sou!

Norberto (quase fora de si)
É sim! É! É...

Dagmar
Mas por quê?

Norberto
Porque nós vamos morrer.

Dagmar
Como assim? Um dia todo mundo morre, meu filho! Está querendo me matar?

Norberto
Já te matei.

Dagmar
Quando?

Norberto
Agora.

Dagmar
Como assim?

Norberto
Sou soro-positivo, burra!