NOVO EMPREGO, de Cristina Fagundes – Post Abraçar faz Bem
Com Karen Liberman e Flávia Espírito Santo – direção Ana Paula Lopes
TINDERBIRDS, de Cláudia Souto – Post Quem Ama todo mundo
Com Marcelo Dias e Zé Auro Travassos – direção Alexandre Bordallo
PODE DEVOLVER?, de César Amorim – Post Duro não é ser Pobre
Com Alexandre Barros e Cecília Hoeltz – direção Raul Franco
CARNES MORTAIS, de Diego Molina – Post Churrasco
Com Kakau Berredo e Bia Guedes – direção Lincoln Vargas
GAROTAS DA URCA, de Paula Rocha – Post Praia da Urca
Com Priscila Assum e Maíra Kesten – direção Vini Messias
CAPITALISMO HUMANISTA, de Ivan Fernandes – Post Flores
Com Marcelo Cavalcanti e Renato Albuquerque – direção Bruno Bacelar
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E como é de praxe, as duas cenas mais votadas pelo público vão parar no youtube.
A mais votada da noite de ontem foi Posso Devolver?
Posso devolver? - de César Amorim.
JONAS (fala de boca cheia) – Foi boa ideia vir jantar na laje, Sandra. Lá dentro tá um calor do cão.
SANDRA – Tá puxado, Jonas. Tá puxado. Engole primeiro, “hôme”.
JONAS – Qual é? Vai dar uma de educada agora?
SANDRA – Não é porque a gente “somo” pobre que não “podemo” ter educação. Fecha essa boca pra mastigar, “hôme”.
JONAS – Agora você tá incomodada. Quando “casamo” você disse que gostava do meu jeito bruto, de macho e tal.
SANDRA – Eu “involuí”, tá? Não fiquei parada no tempo. E de mais a mais, não tive escolha. Embuchei e tive que casar com você. O tempo não volta atrás, meu filho.
JONAS – São essas “revista” aí que você vive lendo, essa tal de “Marricléri”, que custa os olho da cara. Tudo botando coisa na tua cabeça. E esses “pograma” aí da TV. Essa Fátima Bernardes, essa Sônia Abrão, essa Ana Maria... Tudo mulher que não tem o que fazer.
SANDRA – Tudo bem casada, meu filho.
JONAS – A Ana Maria? Com aquele cabelo? Só se for com o Louro. E a Sônia? Só se for com um coveiro. Eu, hein!
SANDRA – Mas a Fátima é perfeita. Marido lindo. Família linda. E educada. Duvido que na casa deles alguém coma de boca aberta.
JONAS – Comer de boca aberta é a intimidade máxima. Só se come de boca aberta na frente de quem a gente “amamos”.
SANDRA – Então, meu filho, você ama o universo “tudinho”. Porque você num fecha a boca nem pra dormir.
JONAS – Vai me “dizê” que eu como de boca aberta nos restaurantes que a gente “vamo”?
SANDRA – Restaurante? Ah, tá, você tá falando do Bob’s?
JONAS – E não é restaurante? Teve mesa, cadeira, comida e bebida é restaurante. Vai dizer que não?
SANDRA – O Bob’s não conta. No Bob’s, o estranho é comer de boca fechada. Tou falando de restaurante caro.
JONAS – E o Bob’s é o quê? Sabe quanto tá o Big Bob? Só com o preço da promoção número 1 a gente alimenta as “criança” aqui de casa por uma semana. Tá por fora.
SANDRA – Tá certo, não vou discutir educação com você. Tenho o dedo podre pra “hôme” mesmo, meu Deus. Só querida ter outra chance. Que castigo!
JONAS – Eita, olha lá no céu, olha! Uma estrela “decadente”! Faz um pedido, Sandra, faz!
SANDRA E JONAS FECHAM OS OLHOS.
JONAS – E aí, o que foi que você pediu?
SANDRA – Um sonho impossível.
JONAS – Eu não pedi nada de impossível que não sou besta. Quer saber o que eu pedi?
MÚSICA ETÉREA. FUMAÇA. MUDANÇA DE LUZ. ENTRA UMA FADA.
FADA – Olá, quem é a Sandra? Ah, só pode ser você. Claro. Sandra. Mulher. Mulher aqui, além de mim, só você.
SANDRA E JONAS – Quem é você?
FADA – Sou a Fada do Cometa. Vim realizar o seu sonho, Sandra.
JONAS – Fada? Só se for do bonde das saFADA. Com essa cara de piranha...
SANDRA – Cala a boca, Jonas! Você é fada mesmo?
FADA – Em luz e pozinho mágico.
JONAS – Pozinho? Eu sabia! Essa fada tá cheirada, Sandra.
FADA – Vamos, Sandra. Não tenho muito tempo. Você fez o seu pedido e eu trouxe o meu catálogo pra você escolher.
JONAS – Catálogo? É da Avon, Natura? Eita, não inventa não, hein, Sandra! Num tou podendo gastar mais nada esse mês. Deixa pra outro dia, dona Fada.
FADA – É... Vendo o shape desse seu marido compreendo bem o motivo do seu pedido. Então, dá uma olhada nesses homens maravilhosos. Qualquer um deles pode ser seu. É só falar.
JONAS – “Hôme”? Você pediu pra me trocar por outro, Sandra?
SANDRA – Pedi sim! Tá? Pedi. Tem algum mal a gente “querermos” mudar de vida? A gente “querermos” o melhor pra consigo mesmo?
FADA – Nunca é tarde para se ter bom gosto, querida. Você está certa. Vamos, escolha que ainda tenho várias clientes insatisfeitas com o marido que precisam de mim.
SANDRA – Nossa! E tá assim a procura? Vem cá, tem alguém famoso?
FADA – Ih, a maioria é famoso, coração. A Gretchen é minha maior cliente. Já precisou de mim umas oito vezes.
JONAS – Essa só com mágica mesmo.
SANDRA – Deixa ver o catálogo. Nossa! Tem muita opção. Todos educados?
FADA – Educadíssimos.
JONAS – Educadíssimos? Homem educadíssimo é boiola. Vai trocar um macho que nem eu por um baitola?
FADA – Olha, sem ofensas, tá? Tenho amigos FADOS que têm uma orientação sexual diferente da considerada convencional e não admito esse tipo de tratamento. Na minha terra, é crime.
JONAS – Que terra é essa?
FADA – Terra do Nunca.
JONAS – Até na Terra do Nunca já é crime? O Brasil tá atrasado mesmo. Olha, eu não quis ofender não. Foi mal aí. Eu “inté” que votei no “Jan Uíliz”.
FADA – E aí, Sandra? Já escolheu?
SANDRA – Já. Quero esse aqui.
FADA – Tudo a ver.
SANDRA – Sou pobre, mas bom gosto não me falta. Isso é que dói.
FADA – Então, vamos lá.
JONAS – Poxa, Sandra, tu vai fazer isso mesmo, minha gata?
SANDRA – Vou sim, Jonas. Não dá mais. Tou cansada de sofrer a vida inteira por uma escolha errada que fiz lá atrás. Tenho uma mulher chique e “sosfisticada” dentro de mim que não aparece por sua causa.
FADA – Então, vamos lá. Eu troco o Jonas pelo... pelo... pelo...
SANDRA – Por esse aqui.
FADA – Não consigo dizer o nome. Estranho. O nome não sai. Travei. Parece que tem alguma magia impedindo. Já sei. Há um choque de pedidos. Recebi dois diferentes vindos daqui. O que foi que você pediu, Jonas?
JONAS – Na real? (Tempo). Pedi pra ficar casado pra sempre com a pessoa que me faz o homem mais feliz do mundo.
SANDRA – Puxa, que lindo! E essa pessoa... sou eu?
JONAS – Quem mais, minha princesa?
SANDRA – Ai, Jonas... Você não existe, sabia? Tem essas “atitude” tão “bunita” e outras “grosseria” que “inté” desanima a gente.
JONAS – Sou um “serumano”, poxa. Mas te gosto muito, minha gata.
SANDRA – Dona Fada, desculpe ter trazido a senhora até o alto desse morro, mas o pedido dele ganhou. Ele não é um sonho, mas é real e me gosta. Do jeito dele, mas me gosta.
JONAS – E tu? Não gosta de mim? Nem um pouquinho?
SANDRA – Te amo, traste. Te amo.
SANDRA E JONAS SE BEIJAM.
FADA – E ainda tem a cara de pau de dizer que tem bom gosto. Olha quem ela escolheu. (Ela mostra a foto do João Kléber). Bem, deixa ver... Próxima cliente. Uma tal de... Suzana. Atriz. Quer um marido jovem. Essa sabe o que é bom.
BLACK OUT.
FIM.
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A segunda cena mais votada foi Tinderbirds
Tinderbird, de CLAUDIA SOUTO
MESA DE BAR. JOCA AGUARDA ALGUÉM. ENQUANTO ISSO, TEM OS OLHOS FIXOS NA TELA DO IPHONE. MEXE NELA SEM PARAR, ARRASTANDO E TOCANDO.
JOCA – Não… (ARRASTA) Não… (ARRASTA) Que horror! Bloquear! (TOCA) Hum… E esse… Pode ser… Será? (ARRASTA PARA OUTRO LADO)
SEGUE MEXENDO NA TELA QUANDO BETO SE APROXIMA DELE.
BETO – Oi... (EM DÚVIDA) Joca?
JOCA – Ah! Oi. Tudo bem cara?
ELES SE CUMPRIMENTAM.
BETO – Chegou há muito tempo?
JOCA – Não, não sei, tava distraído. (DISFARÇA O CELULAR. BETO O OLHA FIXAMENTE, ELE SE INCOMODA) Que foi?
BETO – Seus olhos. Pareciam mais azuis na foto.
JOCA – Ah, é Nashville.
BETO – A cidade?
JOCA – O filtro. Na foto. Deixa meus olhos mais azuis.
BETO – Ah, tá... Eu gosto mais de usar Mayfair. (T) Você tá bebendo o quê?
JOCA – Cerveja. (PARA FORA DE CENA) Amigo! Outra e mais um copo. (T) E aí, pronto pra nigth?
BETO – Pô, Joca, a gente não marcou cinema?
GARÇOM ENTRA, SERVE E SAI.
JOCA – Cinema? Não. A gente marcou night, Marlon.
BETO – Marlon?! Meu nome é Beto!
CHEGA MARLON.
MARLON – (PARA JOCA) Luís?
JOCA – Marlon?
MARLON – Claro, pô. Você marcou comigo, achou que fosse quem?
JOCA – Chega aí, cara. Desculpa Marlon, tava te esperando, mas meu nome é Joca.
MARLON – Joca, claro... Desculpa te chamar e Luís. (PARA BETO, SEM DAR MUITA IMPORTÂNCIA) Oi, cara, tudo bem? (INSINUANTE) Então, Joca, tava doido pra te encontrar depois do nosso match e do papo bom no telefone. Doido pra cair na night contigo. Tive que dar um perdido num tal de Beto. O cara é lindo, gato, tudo mais. Mas queria pegar cinema em pleno sábado a noite. Filme nacional. Deve ser um chato! Vazei.
BETO – E se o “Beto” estiver te esperando lá na Livraria da Travessa? Vai perder o filme. Era pré-estréia, sabia?
MARLON – Pré-estréia é o maior tumulto. E quando o filme é uma bosta e você tem que fingir que gostou? (T) Peraí: como você sabe que eu marquei com ele na Travessa?
BETO – Porque eu sou o Beto.
MARLON – (RECONHECENDO) Beto! Putz! Você... parece mais morenão na foto.
JOCA – Mayfair. Ele usa filtro Mayfair nas fotos.
MARLON – E o que você tá fazendo aqui, se você marcou comigo na Travessa?
BETO – O mesmo que você. Te dando o cano pra encontrar o Joca.
MARLON – (INDIGNADO) Sacanagem a sua, cara! Você não tem coração, não, irmão? Não pensa que ia me deixar plantado no meio dos livros? Olhando relógio, zanzando que nem um otário? Folheando Proust, Saramago e Vogue a noite toda... pra nada?!
BETO – Qual é?! Você acabou de dizer que me deu um perdido, que não queria ir no cinema comigo porque era filme nacional.
JOCA – Gente, fala baixo. As pessoas tão olhando.
BETO – Eu também desisti de ver o filme com você, sacou? Te arrastei pra esquerda, tudo bem. Dei um confere nas tuas fotos – te achei meio Barbie – mas ganhei um match e topei conferir. Mas aí apareceu o Joca...
JOCA – Me deixa fora dessa.
BETO - ... E quer saber? Achei o Joga mais gato. Pronto, falei. Tô aqui com ele na boa. E você aparece pra melar o nosso encontro.
MARLON – Joca, fala pra ele o que a gente marcou: fazer um aquecimento aqui, ir pro Chá da Alice, depois deixar rolar...
BETO – O Joca marcou cinema comigo. (OLHA RELÓGIO) Já era. A sessão tá começando. (T) A gente pula essa. Vamos direto pra festa que eu te falei.
JOCA – Que festa?
BETO – No 00 (ZERO ZERO)... É pra lá que a galera do filme vai. Diretor, atores... Sabe aquele bombadinho? O que não gosta de ler? É o protagonista do filme.
MARLON – Fazia ele todo.
BETO – Ele tá no Tinder.
MARLON – Mentira.
BETO – Deixa eu achar... (PEGA IPHONE E PROCURA)
JOCA – Peço outra cerveja?
CHEGA LUÍS, COM UMA CESTA DE PICNIC. MARLON SACA LUÍS.
LUÍS – Joca! Pô, tô te esperando há uma hora na Travessa. Por que não me mandou um What’s App dizendo que tava aqui? (T) Descurtiu Paquetá?
BETO – Paquetá?!
LUIS – É... Paquetá. Combinamos de pegar a última barca e passar a noite na Praia da Morenina. (BAIXO) Tem uma pedra lá, num canto afastado... rola de tudo! Mó tesão.
MARLON – Eu sei qual é... A gente já foi lá, esqueceu?
LUÍS – (OLHA MARLON E LEVA UM TEMPO ATÉ CAIR A FICHA) Marlon... Oi, cara.
MARLON – Oi.
LUÍS – Tudo bem?
MARLON – Tudo péssimo, né, Luís? Você me deu um Tinder, arrastou pra esquerda, marcou o lance... Tudo lindo. Daí mofei na Praça XV ontem das 9 às 11 da noite te esperando. Só desisti quando ganhei um match dum gatinho que me chamou pra ir pra Rampa.
LUÍS – Foi mal. Tava legal na Rampa?
MARLON – Você sabe que tava. Te vi lá com o Fred. (PARA BETO E JOCA) Peguei o Fred semana passada. O carinha tem um fôlego enooooorme!
BETO – Também já peguei o Fred. Me virou do avesso.
JOCA – Peguei também. É campeão de match, lindo, todo gostoso. Mas é burro, né? Não fala plural, nem conjuga verbo.
LUÍS – Nunca reparei. Sempre que eu saí com o Fred ele tava com a boca ocupada.
MARLON – (CORTA, RÁPIDO) Gente, chega de papo. Qual vai ser?
LUÍS – Como assim “qual vai ser”, vai ser o que tava combinado!
CELULAR DE JOCA VIBRA E ELE PASSA A OLHAR A TELA, ARRASTAR E TOCAR, DISCRETAMENTE.
BETO – O Joca combinou filme comigo não rolou, mas rola festa. (P/ JOCA) Vamos?
MARLON – Hello! Joca combinou aquecimento aqui... E Chá da Alice. Partiu, Joca!
LUÍS – Joca, você combinou Paquetá comigo. (APONTA CESTA) Eu fiz brownie!
JOCA – Galera, acabei de ganhar um match do ator do filme... O bombadinho que não gosta de ler. A gente se esbarra por aí. (SAI)
BREVE SILÊNCIO, TODOS SE OLHAM. ATÉ QUE BETO PEGA O IPHONE E COMEÇA A MEXER NELE. MARLON E LUÍS SE OLHAM.
MARLON – O brownie que você fez é aquele com castanha?
LUÍS – Paquetá vai ser mais legal hoje que seria ontem, sabia?
MARLON E LUÍS SAEM, SEM NEM OLHAR PARA BETO.
BETO – Não... (ARRASTA) Não... (ARRASTA) Deus me livre... (TECLA. DEPOIS VÊ ALGO QUE INTERESSA) Olha quem tá aqui... (TECLA) Match! (FAZ LIGAÇÃO) Alô? Fred? Como vai meu grande? Então... Tô saindo aqui da Cobal... (LEVANTANDO-SE E SAINDO DE CENA) Topa uma festinha da galera do cinema? Topa? Oba! (OUVE) Claro, depois a gente... Você sabe... (RINDO) Ai... Para seu louco...
FIM