quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Segunda noite do Clube da Cena Redes Sociais

Agora um resumo do que foi o Clube da Cena Redes Sociais nesta última quarta.


 
NOVO EMPREGO, de Cristina Fagundes – Post Abraçar faz Bem
Com Karen Liberman e Flávia Espírito Santo – direção Ana Paula Lopes



TINDERBIRDS, de Cláudia Souto – Post Quem Ama todo mundo
Com Marcelo Dias e Zé Auro Travassos – direção Alexandre Bordallo




PODE DEVOLVER?, de César Amorim  – Post Duro não é ser Pobre
Com Alexandre Barros e Cecília Hoeltz – direção Raul Franco



CARNES MORTAIS, de Diego Molina – Post Churrasco
Com Kakau Berredo e Bia Guedes  – direção Lincoln Vargas



GAROTAS DA URCA, de Paula Rocha – Post Praia da Urca
Com Priscila Assum e Maíra Kesten – direção Vini Messias



CAPITALISMO HUMANISTA, de Ivan Fernandes  – Post Flores
Com Marcelo Cavalcanti e Renato Albuquerque – direção Bruno Bacelar 

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E como é de praxe, as duas cenas mais votadas pelo público vão parar no youtube.

A mais votada da noite de ontem foi Posso Devolver?



Posso devolver? - de César Amorim.

JONAS (fala de boca cheia) – Foi boa ideia vir jantar na laje, Sandra. Lá dentro tá um calor do cão.
SANDRA – Tá puxado, Jonas. Tá puxado. Engole primeiro, “hôme”.
JONAS – Qual é? Vai dar uma de educada agora?
SANDRA – Não é porque a gente “somo” pobre que não “podemo” ter educação. Fecha essa boca pra mastigar, “hôme”.
JONAS – Agora você tá incomodada. Quando “casamo” você disse que gostava do meu jeito bruto, de macho e tal. 
SANDRA – Eu “involuí”, tá? Não fiquei parada no tempo. E de mais a mais, não tive escolha. Embuchei e tive que casar com você. O tempo não volta atrás, meu filho.
JONAS – São essas “revista” aí que você vive lendo, essa tal de “Marricléri”, que custa os olho da cara. Tudo botando coisa na tua cabeça. E esses “pograma” aí da TV. Essa Fátima Bernardes, essa Sônia Abrão, essa Ana Maria... Tudo mulher que não tem o que fazer. 
SANDRA – Tudo bem casada, meu filho.
JONAS – A Ana Maria? Com aquele cabelo? Só se for com o Louro. E a Sônia? Só se for com um coveiro. Eu, hein!
SANDRA – Mas a Fátima é perfeita. Marido lindo. Família linda. E educada. Duvido que na casa deles alguém coma de boca aberta.
JONAS – Comer de boca aberta é a intimidade máxima. Só se come de boca aberta na frente de quem a gente “amamos”. 
SANDRA – Então, meu filho, você ama o universo “tudinho”.  Porque você num fecha a boca nem pra dormir.  
JONAS – Vai me “dizê” que eu como de boca aberta nos restaurantes que a gente “vamo”?
SANDRA – Restaurante? Ah, tá, você tá falando do Bob’s?
JONAS – E não é restaurante? Teve mesa, cadeira, comida e bebida é restaurante. Vai dizer que não?
SANDRA – O Bob’s não conta. No Bob’s, o estranho é comer de boca fechada. Tou falando de restaurante caro.
JONAS – E o Bob’s é o quê? Sabe quanto tá o Big Bob? Só com o preço da promoção número 1 a gente alimenta as “criança” aqui de casa por uma semana. Tá por fora.
SANDRA – Tá certo, não vou discutir educação com você.  Tenho o dedo podre pra “hôme” mesmo, meu Deus. Só querida ter outra chance. Que castigo!
JONAS – Eita, olha lá no céu, olha! Uma estrela “decadente”! Faz um pedido, Sandra, faz!
SANDRA E JONAS FECHAM OS OLHOS.
JONAS – E aí, o que foi que você pediu?
SANDRA – Um sonho impossível. 
JONAS – Eu não pedi nada de impossível que não sou besta. Quer saber o que eu pedi?
MÚSICA ETÉREA. FUMAÇA. MUDANÇA DE LUZ.  ENTRA UMA FADA. 
FADA – Olá, quem é a Sandra? Ah, só pode ser você. Claro. Sandra. Mulher. Mulher aqui, além de mim, só você. 
SANDRA E JONAS – Quem é você?
FADA – Sou a Fada do Cometa. Vim realizar o seu sonho, Sandra. 
JONAS – Fada? Só se for do bonde das saFADA. Com essa cara de piranha...
SANDRA – Cala a boca, Jonas! Você é fada mesmo?
FADA – Em luz e pozinho mágico.
JONAS – Pozinho? Eu sabia! Essa fada tá cheirada, Sandra. 
FADA – Vamos, Sandra. Não tenho muito tempo. Você fez o seu pedido e eu trouxe o meu catálogo pra você escolher. 
JONAS – Catálogo? É da Avon, Natura? Eita, não inventa não, hein, Sandra! Num tou podendo gastar mais nada esse mês. Deixa pra outro dia, dona Fada.
FADA – É... Vendo o shape desse seu marido compreendo bem o motivo do seu pedido. Então, dá uma olhada nesses homens maravilhosos. Qualquer um deles pode ser seu. É só falar.
JONAS – “Hôme”?  Você pediu pra me trocar por outro, Sandra?
SANDRA – Pedi sim! Tá? Pedi. Tem algum mal a gente “querermos” mudar de vida? A gente “querermos” o melhor pra consigo mesmo?
FADA – Nunca é tarde para se ter bom gosto, querida. Você está certa. Vamos, escolha que ainda tenho várias clientes insatisfeitas com o marido que precisam de mim.
SANDRA – Nossa! E tá assim a procura? Vem cá, tem alguém famoso?
FADA – Ih, a maioria é famoso, coração. A Gretchen é minha maior cliente. Já precisou de mim umas oito vezes.
JONAS – Essa só com mágica mesmo.
SANDRA – Deixa ver o catálogo. Nossa! Tem muita opção. Todos educados?
FADA – Educadíssimos.
JONAS – Educadíssimos? Homem educadíssimo é boiola. Vai trocar um macho que nem eu por um baitola?
FADA – Olha, sem ofensas, tá? Tenho amigos FADOS que têm uma orientação sexual diferente da considerada convencional e não admito esse tipo de tratamento. Na minha terra, é crime.
JONAS – Que terra é essa?
FADA – Terra do Nunca.  
JONAS – Até na Terra do Nunca já é crime? O Brasil tá atrasado mesmo. Olha, eu não quis ofender não. Foi mal aí. Eu “inté” que votei no “Jan Uíliz”.
FADA – E aí, Sandra? Já escolheu? 
SANDRA – Já. Quero esse aqui.
FADA – Tudo a ver.
SANDRA – Sou pobre, mas bom gosto não me falta. Isso é que dói.
FADA – Então, vamos lá. 
JONAS –  Poxa, Sandra, tu vai fazer isso mesmo, minha gata?
SANDRA – Vou sim, Jonas. Não dá mais. Tou cansada de sofrer a vida inteira por uma escolha errada que fiz lá atrás. Tenho uma mulher chique e “sosfisticada” dentro de mim que não aparece por sua causa.
FADA – Então, vamos lá. Eu troco o Jonas pelo... pelo... pelo...
SANDRA – Por esse aqui.
FADA – Não consigo dizer o nome. Estranho. O nome não sai. Travei. Parece que tem alguma magia impedindo. Já sei. Há um choque de pedidos. Recebi dois diferentes vindos daqui. O que foi que você pediu, Jonas?
JONAS – Na real? (Tempo). Pedi pra ficar casado pra sempre com a pessoa que me faz o homem mais feliz do mundo. 
SANDRA – Puxa, que lindo! E essa pessoa... sou eu?
JONAS – Quem mais, minha princesa?
SANDRA – Ai, Jonas... Você não existe, sabia? Tem essas “atitude” tão “bunita” e outras “grosseria” que “inté” desanima a gente. 
JONAS – Sou um “serumano”, poxa. Mas te gosto muito, minha gata.
SANDRA – Dona Fada, desculpe ter trazido a senhora até o alto desse morro, mas o pedido dele ganhou. Ele não é um sonho, mas é real e me gosta. Do jeito dele, mas me gosta. 
JONAS – E tu? Não gosta de mim? Nem um pouquinho?
SANDRA – Te amo, traste. Te amo.
SANDRA E JONAS SE BEIJAM.
FADA – E ainda tem a cara de pau de dizer que tem bom gosto. Olha quem ela escolheu. (Ela mostra a foto do João Kléber). Bem, deixa ver... Próxima cliente. Uma tal de... Suzana. Atriz. Quer um marido jovem. Essa sabe o que é bom.
BLACK OUT.
FIM.


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A segunda cena mais votada foi Tinderbirds


Tinderbird, de CLAUDIA SOUTO

MESA DE BAR. JOCA AGUARDA ALGUÉM. ENQUANTO ISSO, TEM OS OLHOS FIXOS NA TELA DO IPHONE. MEXE NELA SEM PARAR, ARRASTANDO E TOCANDO.

JOCA – Não… (ARRASTA) Não… (ARRASTA) Que horror! Bloquear! (TOCA) Hum… E esse… Pode ser… Será? (ARRASTA PARA OUTRO LADO)  

SEGUE MEXENDO NA TELA QUANDO BETO SE APROXIMA DELE. 

BETO – Oi... (EM DÚVIDA) Joca? 

JOCA – Ah! Oi. Tudo bem cara? 

ELES SE CUMPRIMENTAM. 

BETO – Chegou há muito tempo?

JOCA – Não, não sei, tava distraído. (DISFARÇA O CELULAR. BETO O OLHA FIXAMENTE, ELE SE INCOMODA) Que foi?

BETO – Seus olhos. Pareciam mais azuis na foto.

JOCA – Ah, é Nashville.

BETO – A cidade?

JOCA – O filtro. Na foto. Deixa meus olhos mais azuis.

BETO – Ah, tá... Eu gosto mais de usar Mayfair. (T) Você tá bebendo o quê?

JOCA – Cerveja. (PARA FORA DE CENA) Amigo! Outra e mais um copo. (T) E aí, pronto pra nigth?

BETO – Pô, Joca, a gente não marcou cinema? 

GARÇOM ENTRA, SERVE E SAI.

JOCA – Cinema? Não. A gente marcou night, Marlon.

BETO – Marlon?! Meu nome é Beto!

CHEGA MARLON. 

MARLON – (PARA JOCA) Luís? 

JOCA – Marlon? 

MARLON – Claro, pô. Você marcou comigo, achou que fosse quem?

JOCA – Chega aí, cara. Desculpa Marlon, tava te esperando, mas meu nome é Joca. 

MARLON – Joca, claro... Desculpa te chamar e Luís. (PARA BETO, SEM DAR MUITA IMPORTÂNCIA) Oi, cara, tudo bem? (INSINUANTE) Então, Joca, tava doido pra te encontrar depois do nosso match e do papo bom no telefone. Doido pra cair na night contigo. Tive que dar um perdido num tal de Beto. O cara é lindo, gato, tudo mais. Mas queria pegar cinema em pleno sábado a noite. Filme nacional. Deve ser um chato! Vazei. 

BETO – E se o “Beto” estiver te esperando lá na Livraria da Travessa? Vai perder o filme. Era pré-estréia, sabia?

MARLON – Pré-estréia é o maior tumulto. E quando o filme é uma bosta e você tem que fingir que gostou? (T) Peraí: como você sabe que eu marquei com ele na Travessa? 

BETO – Porque eu sou o Beto.

MARLON – (RECONHECENDO) Beto! Putz! Você... parece mais morenão na foto. 

JOCA – Mayfair. Ele usa filtro Mayfair nas fotos. 

MARLON – E o que você tá fazendo aqui, se você marcou comigo na Travessa?

BETO – O mesmo que você. Te dando o cano pra encontrar o Joca.

MARLON – (INDIGNADO) Sacanagem a sua, cara! Você não tem coração, não, irmão? Não pensa que ia me deixar plantado no meio dos livros? Olhando relógio, zanzando que nem um otário? Folheando Proust, Saramago e Vogue a noite toda... pra nada?!

BETO – Qual é?! Você acabou de dizer que me deu um perdido, que não queria ir no cinema comigo porque era filme nacional. 

JOCA  – Gente, fala baixo. As pessoas tão olhando. 

BETO – Eu também desisti de ver o filme com você, sacou? Te arrastei pra esquerda, tudo bem. Dei um confere nas tuas fotos – te achei meio Barbie – mas ganhei um match e topei conferir. Mas aí apareceu o Joca...

JOCA – Me deixa fora dessa. 

BETO - ... E quer saber? Achei o Joga mais gato. Pronto, falei. Tô aqui com ele na boa. E você aparece pra melar o nosso encontro.

MARLON – Joca, fala pra ele o que a gente marcou: fazer um aquecimento aqui, ir pro Chá da Alice, depois deixar rolar... 

BETO – O Joca marcou cinema comigo. (OLHA RELÓGIO) Já era. A sessão tá começando. (T) A gente pula essa. Vamos direto pra festa que eu te falei. 

JOCA – Que festa? 

BETO – No 00 (ZERO ZERO)... É pra lá que a galera do filme vai. Diretor, atores... Sabe aquele bombadinho? O que não gosta de ler? É o protagonista do filme.

MARLON – Fazia ele todo.

BETO – Ele tá no Tinder.

MARLON – Mentira.

BETO – Deixa eu achar... (PEGA IPHONE E PROCURA)

JOCA – Peço outra cerveja? 

CHEGA LUÍS, COM UMA CESTA DE PICNIC. MARLON SACA LUÍS. 

LUÍS – Joca! Pô, tô te esperando há uma hora na Travessa. Por que não me mandou um What’s App dizendo que tava aqui? (T) Descurtiu Paquetá?

BETO – Paquetá?!

LUIS – É... Paquetá. Combinamos de pegar a última barca e passar a noite na Praia da Morenina. (BAIXO) Tem uma pedra lá, num canto afastado... rola de tudo! Mó tesão. 

MARLON – Eu sei qual é... A gente já foi lá, esqueceu?

LUÍS – (OLHA MARLON E LEVA UM TEMPO ATÉ CAIR A FICHA) Marlon... Oi, cara. 

MARLON – Oi.

LUÍS – Tudo bem?

MARLON – Tudo péssimo, né, Luís? Você me deu um Tinder, arrastou pra esquerda, marcou o lance... Tudo lindo. Daí mofei na Praça XV ontem das 9 às 11 da noite te esperando. Só desisti quando ganhei um match dum gatinho que me chamou pra ir pra Rampa. 

LUÍS – Foi mal. Tava legal na Rampa? 

MARLON – Você sabe que tava. Te vi lá com o Fred. (PARA BETO E JOCA) Peguei o Fred semana passada. O carinha tem um fôlego enooooorme!

BETO – Também já peguei o Fred. Me virou do avesso.

JOCA – Peguei também. É campeão de match, lindo, todo gostoso. Mas é burro, né? Não fala plural, nem conjuga verbo. 

LUÍS – Nunca reparei. Sempre que eu saí com o Fred ele tava com a boca ocupada.

MARLON – (CORTA, RÁPIDO) Gente, chega de papo. Qual vai ser?

LUÍS – Como assim “qual vai ser”, vai ser o que tava combinado!

CELULAR DE JOCA VIBRA E ELE PASSA A OLHAR A TELA, ARRASTAR E TOCAR, DISCRETAMENTE.

BETO – O Joca combinou filme comigo não rolou, mas rola festa. (P/ JOCA) Vamos?

MARLON – Hello! Joca combinou aquecimento aqui... E Chá da Alice. Partiu, Joca!

LUÍS – Joca, você combinou Paquetá comigo. (APONTA CESTA) Eu fiz brownie! 

JOCA – Galera, acabei de ganhar um match do ator do filme... O bombadinho que não gosta de ler. A gente se esbarra por aí. (SAI)

BREVE SILÊNCIO, TODOS SE OLHAM. ATÉ QUE BETO PEGA O IPHONE E COMEÇA A MEXER NELE. MARLON E LUÍS SE OLHAM. 

MARLON – O brownie que você fez é aquele com castanha? 

LUÍS – Paquetá vai ser mais legal hoje que seria ontem, sabia?  

MARLON E LUÍS SAEM, SEM NEM OLHAR PARA BETO. 

BETO – Não... (ARRASTA) Não... (ARRASTA) Deus me livre... (TECLA. DEPOIS VÊ ALGO QUE INTERESSA) Olha quem tá aqui... (TECLA) Match! (FAZ LIGAÇÃO) Alô? Fred? Como vai meu grande? Então... Tô saindo aqui da Cobal... (LEVANTANDO-SE E SAINDO DE CENA) Topa uma festinha da galera do cinema? Topa? Oba! (OUVE) Claro, depois a gente... Você sabe... (RINDO) Ai... Para seu louco... 
FIM

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Primeira noite do Clube da Cena Redes Sociais

O Clube da Cena Redes Sociais estreou no Teatro Ipanema dia 15/10.

Resumo da primeira noite.

CENAS



A VIDA TE VIRA DO AVESSO, de Ivan Fernandes – Post A vida te vira do Avesso
Com Bia Guedes e Marcello Gonçalves – direção Leo Castro


                                     


A CENOURA, de Diego Molina – Post Finjo que sou uma cenoura
Com Rita Fischer e Jorge Neves – direção Bruno Bacelar




QUEM É KELLY, de Paula Rocha – Post Traição não é Acidente
Com Marcelo Lima e Marcella Leal – direção Fernando Melvin




FALSIDADE, de Cristina Fagundes – Post Falso reclamando de Falsidade
Com Mariana Costa Pinto, João Velho e Cristina Fagundes – direção João Rodrigo Ostrower




BARRADA NA DISNEYLANDIA, de César Amorim – Post Vá a algum lugar onde nunca esteve antes
Com Ana Paula Novellino, Bruno Bacelar e José Guilherme Guimarães – direção Carmen Frenzel




ENCONTRO DEFINIDO, de Bruno Bacelar – Minha barriga não é definida
Com Alex Nader e Mariana Consoli – direção Andy Gercker


E a noite sempre conta com nossos músicos-compositores
Aldo Medeiros e Maria Thalita de Paula


E como de costume, o público votou nas cenas. E as duas mais votadas foram parar no youtube.

A cena mais votada da noite foi Falsidade, de Cristina Fagundes.

Com Cristina Fagundes, João Velho e Mariana Costa Pinto.

Direção: João Rodrigo Ostrower.

Clique e veja Falsidade



Falsidade, de Cristina Fagundes

Um homem, uma mulher e uma senhora sentados à mesa.

Homem – Tá. As férias de julho e o meu aniversário a gente já definiu.  Então o que que tá faltando agora?
Mulher – O Natal.
Homem – O Natal é mesmo. Vamos resolver.
Senhora -  Mas o Natal, já, meu filho?
Homem  – Já mamãe. É melhor.
Senhora – É que o Natal envolve tanta coisa. E eu não pensei em nada ainda.
Mulher – (pra sogra) Até parece. (pro homem) Viu só?
Homem – (repreendendo a mulher) Ana... o que que a gente combinou?
Mulher – (pra ele) Desculpa.
Homem – Tá bom.  Pensa agora mamãe.   Você também amor.  Vamos resolver logo isso.
Tempo. As suas se observam sem silêncio.
Mulher – Ah, já sei.
Homem –  Fala, amor.  
Mulher –  (para a sogra) Eu com certeza vou falar mal da sua roupa.
Senhora – Da minha roupa? De novo?
Mulher – É, vou falar que tá cafona.
Senhora – E eu... vou falar que seu decote tá mostrando os peitos.
Homem (anotando) – Mostrando os peitos.  Que mais?
Mulher – Eu vou falar que você tem cara de pobre.
Senhora – E eu vou falar que você se senta de perna aberta.
Homem (anotando)... perna aberta.  É mesmo.
Mulher – É mesmo o quê?
Homem – Nada. To anotando.
Mulher – Eu vou falar que a senhora tá uma baranga.
Senhora – Uma baranga?  Como assim?
Homem – Mamãe não contesta.  Qual foi o combinado?
Senhora – Eu vou te chamar de periguete.
Mulher – E eu vou falar que a seu perú tá bom pra dar pro cachorro.
Senhora – E eu vou falar que você é uma desocupada.
Mulher – Mas que o cachorro não vai querer.
Senhora – Que deu o golpe no meu filho.
Mulher –  Que você come com a mão.
Senhora – Vou falar que você é atriz.
Mulher – E mastiga de boca aberta.
Senhora – E que atriz é tudo puta.
Homem – (anotando) tudo puta...
Senhora – E ainda palita os dentes na mesa.
Senhora – Tudo puta, piranha.
Mulher – E eu vou falar que a sua rabanada tá seca e ruim. Que nem a senhora.
Senhora –  Tudo puta, não salva uma.
Mulher –  Que se jogar a rabanada pela janela mata um.
Senhora – São umas putas! Umas putas!! (se levanta na intensidade da fala)
Homem – Tá bom mamãe.  Já anotei. Agora senta.
Mulher – Que a senhora tem cara de empregada doméstica.
Homem – (Anotando) olha o preconceito.
Senhora – Tudo puta.
Homem – Mamãe, isso também é preconceito.
Silêncio, as duas se estudam.
Mulher – E eu vou falar que a senhora é uma feirante preconceituosa de terceira que acha que atriz é tudo puta.
Senhora – E eu vou falar que comprei uma colônia bem fedida pra te dar no amigo oculto só pra ver a tua cara.
Mulher – Eu vou falar que aposto que você vai me dar uma colônia bem fedida só para ver a minha cara.
Homem – (anotando) ih... fedida é?  Hum...
Senhora – Eu vou falar que a sua mãe é uma puta também. Que mãe de puta também é puta.
Mulher – Eu vou falar que a minha vontade é mandar a senhora enfiar essa colônia fedida no cú.
Senhora – Tudo puta!! São umas putas!!! (se levanta na intensidade da fala)
Homem – Mamãe, senta.
Mulher –  Enfiar no cú e rodar.
Senhora – Que a sua mãe é uma chacrete velha.
Mulher – Dar 3 voltas.
Senhora – Dessas que faz aquela dança no pau.
Homem – Pole dance. Mamãe. Se chama pole dance.
Senhora –Vou falar que a sua mãe é uma chacrete velha que se pendura no pau.
Mulher –  E eu vou falar que se eu pudesse eu te dava uns 10 tabefes e um bufete nessa tua caroça agora e te quebrava os dentes.
Senhora – Eu vou falar que você tem cara de boqueteira.
Homem (anotando) Quem me dera...
Mulher – (pra ele) Quê?
Senhora – De boqueteira gorda de fim de festa.
Mulher – Mas eu não sou gorda.
Homem – Ana não contesta. Olha o trato.
Mulher – E que eu pudesse eu cuspia na tua fuça.
Senhora –  De boqueteira do mangue.
Mulher -  Um cuspe verde e preguento.  E te pegava pelos cabelos e batia com a tua cabeça nessa parede aqui.
Senhora – Dessas que cobram 5 reais na zona.
Mulher – Pá pá pá, batia assim até derrubar.
Senhora – 5 reais frente e verso.
Homem (anotando) só?
Mulher – Pá pá pá!
Senhora – Frente e verso!
Mulher – Pá pá pá!
Senhora – Tudo puta!
Mulher – Pabaf! Pabaf! até quebrar o côco. Ia sangue pra todo o lado, ia misturar com a calda de ameixa do perú.  Cháaaaá! Até jorrar! Cháaaá! Até o teto!
Senhora – Puta! Puta! Puta!
Mulher - Não ia sobrar nada da senhora!  Nada!!
Senhora – Puta! Puta! Puta!!
Silêncio, as duas ofegantes, se observando.
Homem – E então? Mais alguma coisa?
Silêncio. Tempo.
Mulher – E eu ia te enfiar uma rabanada na boca e ia segurar até você sufocar.
Senhora – Não. Aliás, sim.   Eu ia falar que não vejo a hora do meu filho enjoar de você e te dar um pé na bunda. E você ficar sem dinheiro e começar a mendigar e calhar deu passar um dia e te ver mendigando e cheia de piolho e você me pedir um trocado e eu ia gargalhar e fechar o vidro na sua cara remelenta de atriz mendiga e imprensar o seus dedos no vidro ZUMMMM e aí uma lágrima vai escorrer dos seus olhos e eu vou baixar o vidro e dizer: Frente e Verso.
Homem: Acabou?
Tempo.
Senhora: Piranha.
Mulher: Vaca.
Tempo.
Homem – Bom, agora que tudo foi dito, que a gente já sabe o que cada uma vai falar por trás da outra até o fim do ano, eu não quero ouvir nenhuma reclamação de falsidade nem de uma nem da outra. Tá bem?  Então não quero saber de: Ah que a sua mãe é uma falsa. Falsa é ela. Não.  Que agora a gente já sabe de tudo.  Tá tudo preto no branco. Então, nem mais um pio tá bem?
Silêncio.
Homem – ótimo.   Então passa o bolo mamãe.
Mulher –  Nossa, ficou delicioso Dona Lourdes.
Senhora – Obrigada querida.  A sua canjica também tá divina Aninha!                            

Fim


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A segunda cena mais votada foi Encontro Definido, de Bruno Bacelar. 

Com Mariana Consoli, Alex Nader e convidado. 

Direção Andy Gercker

Clique e veja Encontro Definido

Encontro Definido, de Bruno Bacelar

(Quarto. Rapaz com copo na mão passa em frente laptop. Põe copo ao lado lap, lê algo nele.
Chama)

Irmão – Irmã. Mensagem para você. (Sai esquecendo copo. Mulher saindo banho corre para laptop.
Ah sim... ela é gorda.)
Gorda – (teclando) Combinado então Urso sarado RJ! Daqui a uma hora estarei lá! (Lê resposta.
Tecla) Estarei num tubinho vermelho bem sensual... Você vai saber na hora quem sou eu.
(Lê resposta. Ri excitada. Vê copo e bebe ansiosa. Tecla e fecha laptop.Sai cena e volta com
tubinho vermelho visivelmente menor que ela. Ela vai centro da cena em foco fechado, olha para
tubinho em tom de desafio, respira fundo e com coragem começa a luta para entrar no mesmo.
Tenta por um tempo sem sucesso. Ela cansa e senta cadeira próxima. Exausta. Por trás dela
aparecem duas mãos a massageá-la. Ela gosta mas depois estranha. Vira-se lentamente enquanto
foco abre. Vislumbra homem sarado de sunga, chifre e rabo: é o diabo!)
Gorda – Aiiiiii! O que é isso?
Diabo – “O que é isso” não! Olha o bullying hein...
G – Quem é você?
Di – Quem sou eu? Não sabe ler os códigos? (mostrando) Chifre, rabo, (lembra e pega) ah sim:
tridente! (mostra feliz)
(meio catatônica)
Diabo – Nada ainda? Caraca! Ok, vamos lá! (gestos ilustrativos adivinhação) Uma palavra: Duas
partes! (gestos relativos a palavra dia: sol, acordar...)
G – (choque) Dia?
D – Boa! Segunda parte! (gestos relativos a dar sustos em alguém)
G – Susto? (ele continua) Assustar? (ele continua) “-Boo”?
(acena positivamente)
G – (juntando) Dia-boo... (passada) Você é o diabo...
D – Isso aí.
G – Mas o que você...
D – O que estou fazendo aqui? Bem, digamos que estava passando, meio de bobeira, carente, e
resolvi bater um papo contigo...
G – Ah...
D – Então você está numa de entrar nesse vestidinho?
G – Tubinho...
D – Complicado, não acha?
G – Um pouco...
D – Um pouco?!?! Querida! (rindo discretamente) Desculpe a minha franqueza politicamente
incorreta, mas... você está muuuuito gorda!
G – Isso não pode estar acontecendo...
D – Mas está acontecendo sim, fofinha! O que você quer? Come igual uma draga o dia todo, não
quer subir nem um lance de escada; e vive de chopinho... Aí minha filha, fica difícil, né?
G – Mas também não é assim! Todas as manhãs eu tomo chá verde, suco de clorofila...
D – e um cheseeburguer, um refri “zero”, farofa, maionese, empanado, batata frita, um café “ com
adoçante”, frango a passarinho, provolone a milanesa, litros de chopp... e chá de carqueja para
desgastar... Ridícula!
G – Olha, você me respeita, tá?
D – Gorducha cara de pau...
G – Isso é bullying! Não faça com os outros...
D – Besteira...
G – Isso não é justo...
D – Já viu diabo justo? (diverte-se)
G– Mas afinal de contas, você não tem nada melhor prá fazer não? Vai trabalhar! Levar alguém pro
inferno...
D – Você.
G – Oi?
D – Eu ia te preparar melhor, mas já que você tocou no assunto...
G – Eu vou morrer?
D – (peninha cínica) – É isso, gata.
G – Por que eu?
D – “Por que eu”?!? Fofucha! Você passou seus últimos vinte anos enchendo a cara de gordura,
açúcar, álcool, sem um exerciciozinho, uma dietinha, um médico... Esse desfecho é inevitável!
G – Mas por que o inferno?
D – Digamos que é por... questões de gravidade.
G – Questões de gravidade?
D – Você é lenta, né? (explica) Acompanha: você, desse tamanho, lá pro alto, como? Nem de
foguete...
G – Absurdo! (desesperada) Na bíblia, Nossa Senhora subiu em corpo e alma levada pelos anjos...
D – (gargalha) Agora você apelou... Nossa Senhora é Nossa Senhora... E é magra! (Ri) Você
levada por anjos... Ía precisar de todos os anjos da guarda do planeta... E assim mesmo...
(G vai prá cima dele e ele a repele magicamente)
D – Sem violência! Você desse tamanho me amassa todo...
G – Já sei o que vou fazer! Eu vi isso num filme! (de joelhos reza) Valei-me Nossa Senhora!
(Efeitos. Surge uma senhorinha)
G – (reconhecendo) Vovó?! Desculpa vó, mas eu estava esperando um santo, um anjo...
V – Seu anjo está de folga. Você dá muito trabalho com essa comilança toda...
G – Vovó!!!
V – Minha netinha, o negócio é o seguinte: (olha uma carta) o que consegui prá você é uma
segunda chance, um retorno de experiência. Mas vai ter que entrar numa dieta! Acabou a farra
calórica! Você vai fazer uma reeducação alimentar: a partir de agora é só arrozinho integral,
suquinho de melão, muita água, sopinha, acelga, aipo, alface, brócolis, peixinho grelhado... e muito
exercício. Para sempre... É o que tem para hoje!
G – Mas que inferno...
D – Opa! Chamou?
V – É isso mesmo minha doce netinha, ou dieta ou... ele!
G – Vocês parecem que estão do mesmo lado...
V – Jamais.
D –Imagina...
G – Mas isso não é justo...E o livre arbítrio, gente?
D – Dando uma de kardecista, agora...
G – Eu sou gorda, sim! Posso até cuidar mais da saúde...
V – Uma ginástica...
G – Cala boca vó, que a senhora fumava horrores...
D – Ah, é mesmo...
G – Eu posso entrar numa dança, posso até pegar leve nos chopinhos...
V – Não é bonito moça que bebe... (Neta olha em tom ameaçador)
G – Mas eu estou bem assim! Gosto de ser como eu sou!
D – Uma gorda por ideologia? Que novidade.
G - Que mundo injusto, meu Deus!(Efeitos, surge um anjo de sunga, asas e aureola. Ela para a
avó) Meu anjo num estava de folga?
V = Estagiário.(Anjo entrega carta prá gorda. Sai. Ela lê em silêncio. Olha os dois maliciosamente)
G – Então meu diabinho é tão sarado, magrinho, gostoso... porque fez uma redução de estômago e
duas plásticas, né?
D – Mas faz tempo...
G – Mentira, diabo obeso. Está tudo neste dossiê. Você pesava mais de 140 kg...
D - Problema de glândula...
G – Você não tem moral para apitar nada na minha vida ou na minha morte! Muito menos para
criticar minha... fofura.
D – Mas eu sou o Diabo! E além do mais eu malhei muito! Fiz spinning! Trabalhei glúteo...
G – (tom sacro) – Volte pro inferno Satanás! (efeitos. Diabo grita e desaparece. Prá avó) Own,
vovozinha querida! (vovó aproxima feliz. Gorda estala dedo e aponta, foco acende, tema“Ghost”)
Vá para luz vovó! Eles estão esperando!
V – Mas minha netinha...
G – (irritadamente enfática) Vá para luz vovó! Eles estão esperando! (efeitos. Vovó desaparece.
Luz volta. Ela está com vestido vermelho nas mãos agora do tamanho dela)
G – É isso aí! Se o tubinho não entra, eu visto uma manilha! (veste-se rapidamente, se ajeita, pega
bolsa e sai. Entra irmão atrás do copo. O encontra vazio)
Irmão – Poxa, sacanagem! Ela bebeu o meu santo dyme todo! Acabou com o meu barato!

FIM.